27 março 2020

25 e 3 OS NÚMEROS MÁGICOS NO REINADO DO POUCOCHINHO

25 e 3
OS NÚMEROS MÁGICOS
NO REINADO
DO POUCOCHINHO



Lá em casa, a patroa resolveu sem mais nem menos mudar de quarto, sem que eu lhe tenha feito algo de mal.

Ao acordar já não dá-mos o beijo matinal e sempre que me tento aproximar dela lá vem a ordem de manter distância.

Quando vamos descer a escadaria, enquanto um desce, o outro espera que ele termine para iniciar a sua descida fazendo lembrar um elevador no nosso imaginário.

Na mesa foi aumentada a distância entre os pratos, e quando alguém diz alguma coisa, como chega cá a travessa ou a garrafa do vinho, todos viram a cara para o lado contrário de onde sai a voz.

Agora mesmo recebi ordens que devido à minha idade e por ser um doente de alto risco, tenho que ficar confinado o dia todo à superfície da casa. E chamam eles a isto ficar de quarentena, mas parece-me muito pior que uma prisão domiciliária.

Da janela que dá para a rua vejo algumas pessoas a fazerem fila com certa distância umas das outras, e é engraçado aquele jogo de pés, que quando uma se aproxima a outra recua como se fosse uma dança de algum ballet mal ensaiado. Este bailado é visível na porta da farmácia, na padaria, no pomar, na mercearia, e nos grandes centros comerciais aumenta e muito o número de bailarinos.

Sinto-me prisioneiro dentro da minha própria casa transformada em cela, a aguardar a hora do recreio para desentorpecer as pernas.

Essa hora passou para horário nocturno e com a condição de ter que levar o cão comigo. O animal parece que adivinha que vamos sair e faz-me uma festa dos diabos, mas até esta passeata tem pré-condições estabelecidas.

Só podemos ir a “duas igrejas”, ou melhor dizendo dar a volta ao quarteirão. Como se isto não bastasse, numa cidade deserta de almas, tenho que ir no meio da rua. Pois as instruções são rígidas, e quando aparecer alguma alma perdida, devo desviar-me mais o cão para o lado oposto ao da direcção que ela caminha.

Cruzamos e nada dizemos nem sequer olhamos um para o outro. A minha vizinha que nos vê da sua janela e dantes cumprimentava e sorria, agora apenas acena com o braço de longe ao que eu correspondo do mesmo modo.

E lá vou dando umas voltas ao bilhar grande com o cão, que também já não ladra apenas fala comigo com os olhos mostrando a sua satisfação na sua linguagem gestual, abanando o rabo. Até ele anda triste com a quarentena.

A televisão está intragável. Quando fala o Primeiro Ministro ou outro/a ministro/a do governo, vem logo de seguida os comentadores cartilheiros dos outros partidos afirmarem a pé junto que por mais cara séria que eles ponham, vê-se logo que estão a mentir.


Depois é só desgraças com x doentes corovirais, y mortos e z recuperados. Estes recuperados são os que se lesionaram e agora estão aptos a irem de novo a jogo. Até estes números segundo dizem não andam a bater certo. 

 

Por isso, quando quero saber como vão as coisas na aritmética da pandemia, recorro ao meu amigo do facebook que vai actualizando em tempo real o resultado deste jogo entre a vida e a morte.

Dizem que a economia vai ficar muito doente, embora não seja para todos, mas está assegurada que são os mesmos a suportar o custo de trazer de novo o país à vida real.

Com a diarreia do medo a instalar-se nas pessoas, a fábrica do papel higiénico não tem mãos a medir, assim como a indústria do material de protecção para médicos e enfermeiros não dá vazão ás encomendas.

Nesta guerra, os generais e os soldados que nos defendem, não estão aquartelado em quartéis, mas em hospitais, Postos Médicos, camiões que transportam géneros alimentares, lixo ou vêm com desinfetante lixíviado, dar banho ás ruas da cidade, padarias, farmácias e muitos outros lugares.

Estes capitães sem rostos chamados de médicos, enfermeiros, camionistas, pessoal da limpeza, padeiros, farmacêuticos, etc., todos eles nas suas trincheiras lutam para concertar o país.

E eu, e tu e nós também entramos neste jogo? Claro que sim!...Só que desta vez no banco dos suplentes, ora batendo palmas para apoiar e animar os que estão em jogo, ora estando em casa a torcer para a vitória da nossa equipa contra a do coronavírus.

Mas a partir de hoje vou dormir mais descansado.



As Cortes do Reino reuniram desta vez sem a presença do povo, mas e apenas com a massa cinzenta do povoado e deram à luz 25 medidas para salvar os pobres dos pobres, ao mesmo tempo que o Santuário de Fátima oferecia 3 ventiladores condizente com esse número mágico referente aos Pastorinhos e aos Segredos de Fátima, para ajudarem a salvar 3 almas de cada vez que são utilizados.

Por isso vou festejar a implementação destas medidas, como não podia deixar de ser, tal é a alegria que me invadiu o coração e a alma. 

 

As 25 medidas serão celebradas com 25 copos de Licor Beirão, o melhor de Portugal, a condizer com o nosso monarca, enquanto os 3 ventiladores oferecidos pelo Santuário de Fátima, como dizem respeito a coisas do além, não me sinto com competência para arranjar modo de festejar.


Os maldizentes do reino, mais conhecidos pelos bota abaixo, vieram logo à praça dizer que tudo isto era muito pouco, mas parece-me que esta gente ainda não compreendeu, que vivemos no reinado do poucochinho.

Fernando Oliveira – Furriel de Junho

23 março 2020

SÓ PARA INGLÊS VER

SÓ PARA INGLÊS VER 

 

Estamos mergulhados numa pandemia importada via China para todo o mundo.

O governo chinês cedo se apercebeu da amplitude da mesma e conseguiu contê-la com o menor estrago possível.

Quando a mesma se instalou no nosso país, foi tratada como uma simples constipação, que apenas bastava lavar as mãos que a gripe passava.

As coisas foram-se agravando a tal ponto, que agora estamos em quarentena prolongada, embora alguns portugas (inocentes), mal vêm um dia de sol, resolvem logo ir passear para a marginal voltada ao mar.

A Europa com as calças na mão, não consegue produzir o necessário para se proteger do Coronavírus que agora virou COVID-19 e quem aproveita para vender toneladas de material é a China.

O governo central lá vai dando subsídios para ver se ampara o emprego da malta, enquanto o poder local tenta socorrer os mais frágeis da sociedade.

Mas para além disso é necessário fazer uma desinfestação dos locais públicos. Há dias encontrei um homem de mangueira na mão a desinfectar um largo na cidade. Este verdadeiro D. Quixote combatia o inimigo invisível, sem descanso tentando-o matar por afogamento, tendo direito a selfies.

O pior foi que o cansaço se apoderou dele e viu que a rectaguarda o tinha abandonado, e claro sem uma rectaguarda forte que não tenha capacidade de substituir o combatente esgotado, e não abasteça a frente da batalha com o material necessário para combater, a luta está desde o princípio fracassada.

Assim sem glória, o único combatente sumiu, e o COVID – 19 aniquilou esta frente de combate.

Quando vem alguém de gravata à cidade manda-se lavar as ruas por onde ele vai passa todo sorridente, e agora não será possível arranjar um ou mais carros que venham pulverizar as ruas com desinfectante?

- Talvez sim! - Talvez não!

Bem sei que a resposta não depende de mim, mas por favor não abuse do único combatente para fazer de conta que a desinfestação está em andamento.

É que o COVID-19 não se comove com estas situações de “só para inglês ver”.




A coisa cada vez está mais preta, e os únicos que nos ajudam são os cubanos. Sim, esses mesmo a quem chamamos comunistas, que votamos a favor do bloqueio dos USA ao seu país na ONU, são eles que nos estendem a mão e nos vêm da sua ilha do outro lado do mar tratar de nós europeus, por sinal num país governado pela direita.

São estas pessoas, que ainda nos fazem ter uma réstia de esperança num mundo melhor que há-de vir.

Afinal de contas, nem tudo está perdido, num mundo que muitos, apenas pensam em papel higiénico.

Fernando Oliveira – Furriel de Junho

17 março 2020

HÁ GENTE QUE TUDO LHES SERVE

HÁ GENTE 
QUE TUDO LHES SERVE


Agora foi a vez da placa que se encontrava ao lado da estátua do Padre Américo.

Antigamente

Agora
 
Antes já tinham sido rapinados meninos na rotunda do carneirinho.



Placa toponímica no início e no final da Rua Egas Moniz


Junto à imagem do Santiago de Compostela oferecida pelos nossos amigos galegos, voaram as placas que estavam ao seu lado.


Dois bancos de madeira junto ao pequeno lago no interior do Parque Zeferino de Oliveira vulgarmente chamado pelos penafidelenses por Jardim do Sameiro.


Na Praça da República lá voou a cara do escritor Miguel Sousa Tavares



Realmente, há gente que tudo lhes serve. 

E fazem-no com tanta frequência, que se tornou numa coisa normalíssima, nesta santa terrinha.

05 março 2020

OS 25 COPOS

OS 25 COPOS


Andava cá a matutar comigo mesmo a razão dos 25 copos.

Devido ao colorido o que me veio logo à ideia foi o CDS, mas facilmente abandonei esta hipótese porque o mesmo tem muita mais idade.

Também foi posto de lado que este 25 seja de Abril, porque Abril nunca se vestiu com estas cores.

Como ainda há pouco tempo ouve festança com o Manuel Alegre, relacionei este 25 ao seu poema “ A segunda canção com lágrimas onde o 25 aparece com frequência e que diz assim:

Meu amigo cantava. Dizem que cantava.
E de repente
quebraram-se nas veias os relógios onde
os ponteiros marcavam vinte e cinco anos.

Vinte e cinco navios vinte e cinco mapas
Vinte e cinco viagens para sempre adiadas.
Meu amigo quebrou-se como se fosse de vidro
Ficaram vinte e cinco pedaços de um homem.

Não, não pode ser festejar a morte de um amigo com 25 anos, com 25 copos, pois era macabro de mais.

Antigamente também havia a caixa dos 25 amigos, mas essa já acabou faz tempo. 

 
E quando todo o meu raciocínio estava prestes a encerrar, eis que surge à mente os 25 anos da inauguração da Biblioteca Municipal, no antigo Palacete do Barão do Calvário.

Aí sim … justifica as 25 taças que podemos encher todos os dias com sabedoria e beber serenamente conhecimentos, que nos transmitem os milhares de livros dentro daquelas paredes.

Depois de várias hipóteses, foi esta última que me pareceu mais lógica para a comemoração dos 25 copos, embora cá em casa, ainda se continua a usar as velas sobre o bolo, quando há aniversários.


Fernando Oliveira – Furriel de Junho

01 março 2020

O PATRONATO

O PATRONATO
DA SAGRADA FAMÍLIA



Em Dezembro de 1942, a Ex.ma Senhora D.na Margarida Pinto Lopes Amorim e as suas irmãs D.na Maria do Carmo e D.na Laurinda, compraram o edifício da Rua Direita, N.º 87, na cidade de Penafiel, para aí construir o Patronato, com a finalidade de acolher raparigas abandonadas.

D.na Maria Teresa de Vasconcelos, dedicou-se de alma e coração à obra, sendo desde a primeira hora a sua digníssima Directora.  

A 3 de Maio de 1943, nasceu o Patronato da Sagrada Família. 



Com o decorrer do tempo, logo se verificou que o espaço se estava a tornar pequeno, e como tal, começou-se a pensar no alargamento do mesmo para o lado da Igreja Matriz.

Assim foram adquiridas duas pequenas habitações aí existentes, mas todos tinham a noção que só com a ajuda do governo central a obra se tornaria realidade.

Aproveitando a vinda a Penafiel, do Governador Civil do Porto, Dr. Jorge da Fonseca Jorge, D. Maria Teresa endereçou um convite ao mesmo, e outro ao Presidente da Câmara de Penafiel, Coronel Cipriano Alfredo Fontes, para ambos virem almoçar no Patronato, no dia 31 de Dezembro de 1964, os quais foram aceites. 



Para além destes ilustres convidados, também tomaram parte o Rev. Vigário da Vara e Pároco de Penafiel, Albano Ferreira de Almeida, e os membros da Direcção do Patronato, D.na Maria Teresa, Sr. Adriano Alves Barbosa e Manuel Babo, para além das cercas de três centenas de crianças de ambos os sexos.



O almoço foi servido pelas Ex.mas Senhoras D.na Dalila Viana, D.na Isabel Afonso e Igilde Barbosa.

Na cozinha a azáfama era grande, com as louças a serem lavadas para servir novamente, em sucessivas avalanches de miúdos, porque sendo o refeitório de dimensões razoáveis, não era o suficiente para tanta gente. 


Terminado o almoço usaram da palavra para saudar o ilustre visitante, as meninas Maria Emília Campos e Filomena Maria Ferreira Ramalho, que no final receberam uma estrondosa salva de palmas. 



De seguida o Sr. Adriano Alves Barbosa, historiou a fundação da obra, que em sua opinião se deve a um autêntico milagre a que está ligado desde o seu início o nome da grande benemérita e bondosa D.na Sílvia Cardoso, e que os actuais Directores têm continuado, esforçando-se por aumentar, cada vez mais, a acção benemérita e altruísta de evitar que caiam no abismo centenas de jovens que por aquela casa têm passado.

Pediu depois a Sua Excelência o Sr. Governador Civil, para que fosse o intérprete junto das esferas superiores dos anseios da Direcção do Patronato que é o iniciar-se quanto antes as obras que já estão projectadas. (Cá para nós que ninguém nos ouve, isto é o que se chama na gíria popular, lançar o barro à parede).

No final o Dr. Jorge da Fonseca Jorge, num feliz improviso, prometeu interessar-se por tão útil e necessária obra, e agradeceu o bem que se faz aos infelizes que se abeiram do Patronato da Sagrada Família.

Depois de percorrer as precárias divisões do Patronato, rumou à cidade do Porto.


D.na Maria Teresa, desloca-se a Lisboa e consegue assegurar a comparticipação de 75% do custo da obra, ou seja 2.100.000$00, suportada em partes iguais pelo Ministério das Obras Públicas, Ministério da Saúde e Assistência e Fundação Calouste Gulbenkian. 

Os restantes 25% correspondendo ao montante de 700 contos ficaram a cargo do Patronato, o que, como é óbvio, excede em muito os seus magros recursos financeiros. D.na Maria Teresa, lança uma campanha para angariação de fundos, para que o sonho se torne realidade. Desde o sorteio de uma linda toalha de mesa em linho, cujos bilhetes foram colocados à venda nas lojas comerciais da cidade, peditórios em todas as freguesias do concelho, programa de variedades realizadas no Cine-Teatro S. Martinho, cujas receitas se destinavam ás obras do Patronato e cortejo de oferendas.


E como escreveu Fernando Pessoa, no poema "O Infante", Deus quer, o Homem sonha, a obra nasce. 

Mas já que falei em poesia, vou incluir neste texto o poema de autoria de Maria Giselda com o título:

Patronato da Sagrada Família
(ao pobre, ao órfão e à desamparada)

Alegra o rosto teu, oh pobrezinho!
Triste e cansado a procurar guarida!
O pão que te for dado com carinho
Sabe melhor do que a melhor comida.

Não há pobreza onde houver caridade.
Tu não és pobre por não teres pão!
Ainda é mais pobre aquele que a bondade
Nunca lhe perfumou o coração.

Aquela estrela que tu vês além,
É a Sagrada Família, a tua casa.
Tem no seu seio o zêlo de uma mãe.
Tem o calor que a pomba tem na asa.

Olhos no Céu, a boca em oração,
Vai direito, direito a esse altar
E deixa só bater teu coração,
Que as portas logo se abrem par a par.

Oh ente pequenino abandonado!
Oh órfão mal tratado pela desdita!
Não choreis mais o vosso triste fado,
Que é também vossa essa casa bendita.

Desamparada que vives também
Aos encontrões da tua pouca sorte!
Recebes nela o amparo duma mãe,
Verás nela brilhar a estrela Norte.

Obra grandiosa, bela e sublime!
Obra gigante em força de vontade!
Escolheu Deus para ela um pulso firme
Dando-lhe fé, esperança e caridade.

E ao ver o altar que Penafiel tem,
- Porque Jesus não olha ao desbarato -
Logo escreveu no Santo Rol do Bem!
A Sagrada Família, o Patronato.


Nos dias de hoje, a pobreza continua com outras roupagens, e por vezes até envergonhada espreitando o mundo por entre as vidraças da desgraça. 

Há quem diga que isto nos devia fazer corar de vergonha, mas francamente não acredito que alguém core, num país que já perdeu à muito a sua vergonha, embora nos fizessem acreditar que a pobreza ia desaparecer a partir de Abril. Francamente, a única diferença entre o antes e o depois de Abril, é a distância que separa a sopa dos pobres do banco alimentar.

Fernando Oliveira - Furriel de Junho