05 dezembro 2021

PENAFIEL NA IMPLANTAÇÃO DA REPÚBLICA

 PENAFIEL NA

IMPLANTAÇÃO DA REPÚBLICA


José Relvas proclama a República da varanda da Câmara Municipal


No dia 5 de Outubro de 1910, em que a monarquia terminou o seu reinado, e a república ensaiava os seus primeiros passos, em Penafiel, estava instalado no quartel, o 2.º grupo do Regimento de Artilharia N.º4 e na Rua do Carmo o 3.º Batalhão de Infantaria N.º20.

 


Pelas 7 horas da manhã do dia 7 de Outubro foi dado conhecimento a todos os oficiais do Regimento de Artilharia N.º4 e do 3.º Batalhão de Infantaria N.º20, de um telegrama do comandante da 6.ª Divisão militar, General de Brigada Monteiro com o seguinte teor:

Tendo Ex.mo Ministro de Guerra do Governo Provisório, Coronel de Artilharia António Xavier Correia Barreto, comunicado proclamação da república, participo a V. Ex.ª que prometi obedecer e defender governo legalmente constituído, informado esperar ser acompanhado por V. Ex.ª oficiais sob seu comando.


Comandante Divisão Monteiro – General de Brigada”


Os oficiais reunidos pelas 9h no quartel em Penafiel aprovaram por unanimidade apoiar a República e o Governo Provisório que era assim constituído:


Teófilo de Braga


Presidente do Governo – Dr. Theophilo Braga

Ministro da Fazenda - Basílio Teles

Ministro da Justiça – Affonso Costa

Ministro dos Estrangeiros – Bernardino Machado

Ministro do Interior – António José de Almeida

Ministro das Obras Públicas – António Luiz Gomes

Ministro de Guerra – Coronel Xavier Barreto

Ministro da Marinha – Azeredo Gomes

Uma das coisas que me chamou a atenção foi o telegrama ser dirigido aos oficiais e não ao comando. Ora acontece que o Regimento de Artilharia N.º 4, tinha o seu comando aquartelado em Amarante e o Batalhão de Infantaria N.º 20 em Guimarães, daí a razão de o mesmo ser remetido aos oficiais que se encontravam nestas unidades militares em Penafiel.




Também nesta sexta-feira de 7 de Outubro de 1910, os penafidelenses vieram para a rua dar vivas à República”.

Pelas 17h30, organizou-se uma manifestação, na rua Formosa (hoje Av. Egas Moniz e Sacadura Cabral), próximo do edifício do Grémio Penafidelense (actualmente Assembleia Penafidelense), acompanhada por populares, membros da comissão municipal, oficiais, sargentos e praças do regimento de artilharia N.º 4 e do 3.º batalhão do regimento de infantaria N.º20, precedida por uma banda de música tocando a Portuguesa.




Seguiu pela rua Serpa Pinto, Largo da Ajuda, Rua Alfredo Pereira, Largo S. Bartolomeu, travessa e rua da Vista Alegre, entrando de novo na Rua Alfredo Pereira, Largo da Ajuda, Rua do Paço e Praça Municipal. Durante o percurso foram lançados muito foguetes e dados muitos vivas à República.

 


Chegados ao edifício da Câmara Municipal de Penafiel, os manifestantes que conduziam diversas bandeiras republicanas entraram pela escadaria dos Paços do Concelho e, acedendo à varanda, içaram ali uma dessas bandeiras, ouvindo-se então uma prolongada salva de palmas e numerosos vivas à República e ao Governo Provisório.

A guarda do edifício, que era feita por uma força do regimento de artilharia N.º 4, formou e fez a continência ao ser hasteada a bandeira.


Armando Barbosa

O vereador Armando Barbosa, vindo à varanda do edifício, disse estar proclamada a República, palavras que foram cobertas por um grande salva de palmas e muitos vivas.

Belmiro Nogueira Xavier, professor nesta cidade, pediu silêncio e tomou a palavra:


Cidadãos

O dia de hoje marca uma data gloriosa nas páginas da história pátria, pois é o advento, em Portugal, do governo à muito suspirado pelo povo.

Dêmos-lhe todo o nosso apoio e sejamos sempre unidos afim de que Portugal volte a ser o que foi outrora, respeitado, temido e poderoso.

- Viva a República Portuguesa!


Ao terminar este breve discurso, muitas palmas e vivas ecoaram na Praça Municipal.


Coriolano de Freitas Beça


A manifestação tomou a direcção do quartel, e ao passar em frente da casa do sr. Coriolano de Freitas Beça, os manifestantes pararam e ao som de vivas e palmas até este aparecer à varanda agradecendo a manifestação de que estava a ser alvo.

 



Chegada ao quartel, foi dada autorização a alguns militares e populares para subirem até à varanda, situada sobre a porta de armas, para aí amarrarem a bandeira à sacada em virtude de a bandeira republicana não ter adriça para ser içada no mastro. Do lado esquerdo do portão de entrada formou a guarda que prestou continência, enquanto a banda de música tocava a Portuguesa.




Saídos de ali, os manifestantes voltaram à Rua Formosa (Av. Egas Moniz e Av. Sacadura Cabral), descendo a Rua Conde de Ferreira, seguindo pelas ruas do Bom Retiro, Sacramento e Carmo parando em frente à porta do quartel do 3.º batalhão do Regimento de Infantaria N.º 20, cuja guarda estava colocada ao longo da rua.




Franqueado o acesso ao andar superior a um grupo de manifestantes, foi ali arvorada a bandeira sob uma estrondosa salva de palmas. Ecoaram mais uma vez os vivas à República e ao exército, ao 20, e a banda de música tocou a portuguesa. Ao ser hasteada a bandeira a guarda apresentou armas.


O Professor, Belmiro Nogueira Xavier, subir à varanda do quartel e usou da palavra.


Cidadãos

Vai tremular altaneira na frontaria deste edifício, onde vivem os bravos soldados do 20 de Infantaria, a bandeira da República, que é a bandeira da Pátria.

Respeitai-a e habituai-nos a ver nas suas cores o sangue dos heróis que nas ruas da capital se bateram pela República, e a esperança de um futuro risonho e feliz.

Quando terminou a sua improvisada alocução, uma estrondosa salva de palmas fez-se ouvir, envolta de vivas à República, ao exército, à armada, ao governo provisório, vivas calorosamente correspondidos.




A manifestação subiu as ruas do Carmo, Direita, Paço, Largo da Ajuda, Serpa Pinto parando em frente dos Paços do Concelho, que se encontrava com a frontaria iluminada.

Aí foram dados os derradeiros vivas à República e ao Governo Provisório, tendo os manifestantes começado a dispersar.

Passados anos, a 1.ª República começa a enfrentar graves problemas económicos e sociais a nível nacional e internacional, dando origem ao Golpe Militar de 28 de Maio de 1926, comandado pelo general Gomes da Costa e que vai instaurar uma ditadura, que o 25 de Abril de 1974 vai pôr termo.



Passados quase meio século do 25 de Abril, os partidos tornaram-se numa espécie de “máfias” organizadas para o assalto ao poder para distribuírem benesses pelos seus correligionários, e político (com raras excepções), é sinónimo de aldrabão.

Como se tudo isto não bastasse, veio-se agora a saber que se fazia tráfico de droga, ouro e diamantes no interior do exército português em missão da ONU. No entanto o Comandante Supremo das Forças Armadas veio logo a terreiro afirmar que isto em nada beliscava o prestígio das mesmas. Das duas uma, ou o homem se enganou naquilo que disse, ou então estas coisas já são tão banais neste país, que em nada afecta a reputação das tropas.

Mas como escreveu Sophia de Mello Breyner Andresen na sua Cantata da Paz, “Vemos, ouvimos e lemos, Não podemos ignorar”, hoje compreendo muito melhor, porque o 28 de Maio teve tanto apoio popular, que até aos dias de hoje, por incrível que pareça, ainda há quem o deseje de volta.


Fernando Oliveira – Furriel de Junho