01 novembro 2022

FUNERAL SEM PADRE

 

FUNERAL SEM PADRE

de

Simão Júlio d`Almeida Motta Barbosa

 


1852 - 1907

 

Antigamente, quando algum funeral não era acompanhado de sacerdote, logo se dizia que o defunto era ateu.

Mas como há sempre a excepção para confirmar a regra, hoje vou-vos falar, sobre um defunto católico muito estimado nesta cidade de Penafiel, que no seu cortejo fúnebre não teve direito a padre.

O sr. em causa chamava-se Simão Júlio d`Almeida Motta Barbosa, pai do poeta penafidelense José Júlio, que faleceu no dia 19 de Fevereiro de 1907, na sua residência na Quinta de Louredo, com 55 anos de idade.

 


 

Em vida, entre outras coisas, pertenceu ao Partido Regenerador, foi vereador, fiscal da Câmara em 1878, Presidente da mesma desde 18 de Agosto de 1878 até 31 de dezembro de 1879, em 14 de Janeiro de 1886 foi nomeado fiscal técnico e chefe de cantoneiros sendo aposentado em Dezembro de 1906, Fundador do Sindicato Agrícola e fundou a Assistência aos Tuberculosos

 


 

Fez parte desde a fundação da Associação Philantrópica de Bombeiros de Penafiel, que a partir de 10 de Junho de 1892, passou a designar-se Associação dos Bombeiros Voluntários de Penafiel, e foi eleito seu 1.º Comandante em Assembleia Geral de 20 de Julho de 1881, cargo que manteve até ao seu falecimento.

A Simão d`Almeida se deve um importante melhoramento que foi a colocação de uma linha telefónica que ligava o serviço de incêndios da cidade de Penafiel com o de Paredes para se ajudarem mutuamente.

 


 

Também em 1883 pediu à Câmara Municipal de Penafiel uma verba para colocar nas torres das igrejas caixas para fazer os sinais de incêndio, que os penafidelenses mais idosos se lembram perfeitamente.

 

Mal soube do sucedido, a corporação dos Bombeiros Voluntários de Penafiel reuniu de emergência sob a presidência do Sr. Joaquim Peixoto, secretariado pelos srs. Germano Guimarães, 2.º comandante e António Leal de Magalhães. Enalteceram as qualidades do extinto, e a homenagem que lhe haviam de prestar. Assim a direcção deslocou-se a Louredo para dar os sentidos pêsames à família enlutada, e nomeou turnos de bombeiros para velarem dia e noite, o cadáver que se encontrava em câmara ardente na casa da Quinta de Louredo.

 


 

O Presidente da Câmara, António Teixeira da Silva, na sessão de Câmara de 19 de Fevereiro de 1907, disse que tendo falecido o sr. Simão Júlio d`Almeida Motta Barbosa, que foi vereador e presidente desta Câmara, propôs sendo por unanimidade aprovado, que se exarasse na acta da presente sessão um voto de profundo sentimento pelo falecimento daquele cidadão, que em sinal de sentimento se levantasse a sessão e se desse conhecimento desta resolução à Ex-ma família enlutada.

 

António Augusto Gonçalves de Carvalho

 

Quarta-feira, 20 de Fevereiro de 1907, pelas 16 horas, saíram do Quartel dos Bombeiros, à Rua do Paço, em direcção a Louredo devidamente uniformizados os piquetes dos Bombeiros Voluntários do Porto, de Paredes e Penafiel, comandados pelo sr. António Augusto Gonçalves de Carvalho, comandante dos Bombeiros de Paredes, o qual assumiu o comando das três corporações, acompanhadas da respectiva direcção dos Bombeiros de Penafiel, levando a bandeira da corporação envolta em crepes.

 

Simão Júlio d`Almeida Motta Barbosa

Pela 4,30h da tarde, sai da Quinta de Louredo e é colocado na carreta dos bombeiros o caixão conduzido pelo sr.  António Augusto Gonçalves de Carvalho 1.º Comandante dos bombeiros de Paredes e dois subordinados, e o sr. Ricardo Arroyo, 1.º Comandante dos Bombeiros do Porto e dois subordinados. Seguia-se o padre Dr. Cerveira de Almeida coadjuvado pelo reverendo Manoel Moreira dos Santos. Portador da chave do caixão o major de cavalaria o sr. Francisco de Vasconcellos Carvalho Nogueira, cunhado do extinto, e o sr. Augusto de Almeida transportando o capacete e o machado do seu comandante, envolto em tecido preto. 

 

 


O cortejo fúnebre tomou a sua marcha sendo a carreta puxada pelos bombeiros de Penafiel, Rua do Carmo fora até à Igreja Matriz. Aí o caixão foi levado para um palanque colocado no interior do templo, assistindo os acompanhantes que enchiam a igreja à missa de corpo presente.

 

 


 

Findo o acto religioso, foi conduzido e colocado na carreta o caixão pelos caseiros do falecido. Nesta altura, sobre uma chuva impertinente, o reverendo Manoel Moreira dos Santos promoveu um incidente muito desagradável em recusar-se a acompanhar o féretro

Em seguida, o fúnebre cortejo encaminhou-se Rua Direita acima, parando em frente do quartel dos bombeiros, conforme a vontade expressa pelo extinto 1.º Comandante dos Bombeiros de Penafiel, Simão Júlio d`Almeida Motta Barbosa.

Nessa época, o quartel dos bombeiros situava-se na Rua do Paço, nos baixos do palacete do Sr. Vasco de Araújo Queiroz, prédio onde actualmente funciona a Escola Superior de Enfermagem do Tâmega e Sousa da CESPU.

 

 


 

Retomando o percurso pela Praça Municipal, Rua Formosa (hoje Av. Sacadura Cabral e Egas Moniz), em direcção ao cemitério da Saudade.

 

 


 

Debaixo de uma chuva copiosa, o caixão foi levado para a capela do cemitério, pelo srs. dr. Joaquim Peixoto, Presidente da Associação dos Bombeiros Voluntários, Ramiro Augusto Pereira do Lago, António Leal de Magalhães, José Bento de Figueiredo, Eduardo Pinto e Augusto de Almeida, onde ficou depositado.

 

 


 

Como diz a sabedoria popular, “para tudo na vida, se quer sorte”, mas pelos vistos, até na morte precisamos dela para as coisas correrem como deveriam correr, como é o caso de um funeral de um homem bom, não levar padre, na sua derradeira viagem para a sua última morada.

 

Fernando Oliveira – Furriel de Junho