21 novembro 2007

A ROSINHA DO PÃO-DE-LÓ

A ROSINHA DO PÃO-DE-LÓ
(A NOSSA GENTE)

A vivência acelerada em que nos movimentamos, é de tal ordem que por vezes nem cumprimentamos pessoas amigas que se cruzam por nós na rua. Isto não é fruto de má educação, mas sim desta correria constante atrás do tempo, que nos faz passar sem as ver.

Na já bicentenária cidade de Penafiel vale a pena percorrer as ruas velhinhas e observar alguns estabelecimentos que mantêm a traça tanto no seu interior como no seu exterior, enquanto é tempo.

Percorrendo a rua Dr. Joaquim Cotta poderá admirar um destes exemplares que é a casa da dona Rosinha do pão- de-ló, bolinhos de amor e do pão podre.

Esta pequena grande casa, conseguiu chegar aos nossos dias mantendo os métodos de fabrico de outros tempos, não enveredando pela industrialização, preferindo a qualidade à quantidade.

Quem ousa entrar naquele património, dá de caras com uma hospedeira da Air France em cartão que nos olha de frente com um sorriso que não se perde com o tempo.

O balcão de vidro e a balança com os pratos reluzentes como ouro dão um toque de distinção ao estabelecimento.

Nas paredes as medalhas de ouro ganhas em certames de gastronomia, atestam o apreço que estes bolos angariaram bem longe de portas.

Depois as mesas redondas com tampos de vidro guardam a inspiração de quem por lá passou a saborear estas guloseimas, e deixou o seu testemunho poético.

São exemplo disso os versos que a seguir transcrevo:

OS BOLINHOS DA ROSINHA
COM VITAMINAS TAMANHAS
P'RA BEBER UMAS PINGUINHAS
SÃO MELHORES DO QUE CASTANHAS.

ESTA CASA EM QUE ESTAMOS
É DOS BOLINHOS DE AMOR
FOI A PALAVRA MAIS DOCE
QUE DEIXOU NOSSO SENHOR


Se há quadras dedicadas ao estabelecimento, outras há dedicadas à terra como:

OS HOMENS SÃO O DIABO
NÃO HÁ MULHER QUE O NEGUE
MAS TODAS ELAS PROCURAM
UM DIABO QUE AS CARREGUE

TU TENS DOIS OLHOS NA FACE
QUE BELEZA QUE REQUINTE
SÃO VERDES DA COR DA ALFACE
DA COR DAS NOTAS DE VINTE

MATAR TEU CORAÇÃO NÃO QUERO
NEM TÃO POUCO O DESTROÇAR
É CORAÇÃO LEAL E SINCERO
DIGNO DE SE PODER AMAR

SEM QUERER EU TE BEIJEI
SEM SABER O QUE FAZIA
TOMEI-LHE O GOSTO E DEPOIS
SÓ MAIS UM, EU TE PEDIA

Um enigma que me trazia apreensivo era como a dona Rosinha conseguia regar os dois potes de barro que ladeiam a rosca de pão-de-ló no exterior da casa.

Certo dia tive a sorte de ao passar a senhora estava nesta tarefa. A água é conduzida aos potes transformados em floreiras através de uma cana-da-índia furada de lés-a-lés. Com doçura o regador vai lentamente vomitando água na conduta de cana que por sua vez a leva até aos vasos, com a paciência e os mimos que as plantas requerem. São referências como estas ruas, casas, pessoas e gestos, que nos fazem manter as raízes e gostar deste pedaço de chão, que é a nossa terra.

03 novembro 2007

VALPEDRE

VALPEDRE
O NOSSA CAMPEÃO
(A Nossa Gente)Não sei se este escrito lhe vai cair nas mãos, mas o que eu sei é que há muito que lhe devo estas linhas. Estou plenamente convencido, que com o nosso crescimento físico e intelectual, os nossos ídolos vão sendo renovados. Mas se esta renovação pode ser feita sem grandes dificuldades, já esquecê-los é mais difícil. Se me dão licença vou falar do meu primeiro ídolo “O Valpedre”.

Decorriam os anos 60 e a Escola Técnica abria pela primeira vez as suas portas em Penafiel. A nível de ensino, a cidade ficava apetrechada com o Colégio do Carmo e a nossa Escola Industrial.

Ora as olimpíadas estudantis está fácil de ver que se disputavam entre estes dois estabelecimentos de ensino, vendo cada um no outro o seu rival ou adversário como lhe queiram chamar. Evidentemente que os colegas do Colégio do Carmo já tinham experiência e treino (dado pelo Sargento Lima), ou como se diz na gíria traquejo nestas andanças. Assim conheciam todas as manhas e truques a aplicar nas várias modalidades.

Por outro lado, os da Escola Industrial faziam das tripas coração, para contrariarem toda esta tendência de vitória antecipada. Para os leitores terem uma ideia dessas dificuldades, vou-lhes relatar um exemplo: os mais matulões como possuíam mais cabedal, eram escolhidos para o lançamento daquela esfera de ferro, chamado de peso. Acontece que nem isso existia na escola e o lançamento do peso era treinado com um paralelepípedo desses das nossas estradas. O Chico Ramelau (de apelido), natural de Vila Cova, que tinha força como um burro, lá colocava o paralelo nos queixos e depois de rodopiar lá o lançava. Só que nestas coisas, além da força, é preciso jeito para o fazer voar e isso era coisa que ele não possuía. E por mais apelos que o Chico fizesse aos seus músculos, mal a esfera saía da sua mão, parece que a força da gravidade triplicava.

Já perto do final e de a Escola Industrial acumular derrota atrás de derrota, eis que chega a prova de corta-mato. Aí todos partiam juntos, mas à chegada claro estava que apenas se via um, sozinho, isolado sem ninguém. Esse era o nosso herói, o nosso campeão, o nosso ídolo, “O Valpedre”. Entrava no estádio e a malta toda de pé aplaudia enquanto o nosso amigo com os braços no ar e todo sorrisos, cortava a meta e salvava assim a honra do convento que neste caso era da Escola Industrial. Corríamos a abraçá-lo, enquanto os mais matulões o levavam aos ombros, isso porque nesta altura a cantilena do “Olé, olá, o Valpedre é o melhor que há”, era desconhecida, senão lá estaríamos nós a trauteá-la, ou então aquela utilizada pelas claques desportivas do “quem não salta é …(aquela coisa que não se diz e que todos sabem e ronda o nível abaixo de raso). Bem, mas enquanto o Valpedre era a razão do nosso contentamento, o Sargento Lima de cronómetro enfiado nos dedos, lá media os segundos e os minutos de atraso que trazia o seu 1º pupilo, quando chegasse à meta. É que por mais voltas que ele desse nos treinos, os seus instruendos não tinham canetas que chegassem aos calcanhares do Valpedre. Claro está que o grande campeão Valpedre, não saía em letras garrafais nos jornais, não se via na televisão, nem se ouvia na rádio. Isto é o que se pode chamar “um ídolo para consumo caseiro”.

Depois da Escola fomos à vida. De certeza que o Valpedre já atingiu algumas metas, embora para tal tenha sentido muitas vezes o sabor amargo da derrota.

Mas, não o estou a ver a usar o “doping da cunha”, ou do “Partido”, para fintar ou ultrapassar os outros atletas de todos os dias, nem justificar os infortúnios com o “Sistema”, que é uma coisa que não se vê, mas se sente no dia a dia e aonde cabem todas as injustiças e desculpas. Nada disso!... O meu ídolo não pode descer tão baixo, e tal como outrora joga limpo, sempre de cara levantada e sorriso nos lábios.

Embora o esteja a imaginar agora com uns quilitos a mais na pele, com os colesteróis e os ácidos úricos a atrapalhar, mais dia, menos dia, temos que fazer o salto em altura para os braços do Criador.

Mas se Deus quiser, ainda teremos muitos e bons anos para treinar essa nova modalidade.

Até lá, um abraço e um Até Sempre Campeão.