18 janeiro 2008

A MALTA É FIXE

A MALTA É FIXE
(A Nossa Gente)Há quem diga que são poucos mas bons, que acreditam na utopia, que teimam em querer mudar o mundo para melhor, e que deitam mão a tudo para despertar consciências.

Agora a onda é sobre a pobreza global. Fazem palestras, marchas, saraus de poesia e trauteiam canções que são verdadeiros hinos de protesto de ontem e de hoje a este neoliberalismo instalado.

No dia 26 de Janeiro haverá uma Acção Global, mas no dia 27 a fome continua.

- Até quando?

- Até quando?

Aqui vai o meu contributo e o meu abraço às vítimas da fome, embora pense que a solução não passe pela caridadezinha do costume, nem por estas coisas bonitas, mas com esta malta fixe, disso não tenho dúvidas.

AOS CAVALOS DA RAINHA

Morrem crianças à fome
Com o corpo definhado
E os cavalos da rainha
Têm pasto requintado

Choram mães desesperadas
De coração humilhado
E os cavalos da rainha
Têm ar condicionado

Desfalecem os mendigos
Pedindo aos céus um telhado
E os cavalos da rainha
Vivem em tecto doirado

Tanta miséria no mundo
Tanto grito angustiado
Para os cavalos da rainha
Terem o luxo a seu lado

05 janeiro 2008

AROMAS PERDIDOS

AROMAS PERDIDOS
(A NOSSA TERRA)
Muito antes de sermos invadidos pelas pizas e pelos hambúrgueres, a cidade de Penafiel, possuía aromas próprios.

Logo pela manhã, quem se não lembra das padeiras que com as suas canastras impregnavam as ruas do cheirinho a pão quente.

Aos domingos quem ficava indiferente ao aroma do arroz de forno, saído da pensão Aires ou da Morais? Quem lá passava embebedava as narinas de tal maneira que nos fazia mastigar saliva para enganar o estômago.

O Ribeiro dos Cafés, com o seu moinho colocado na frente de balcão, quando ligado espalhava por toda a Rua do Paço um cheiro a café que consolava qualquer mortal que por ali metesse os pés.

Mal apontava o Outono, as castanheiras tal como hoje, montam os seus fogareiros nos passeios da cidade, mas a que eu vou falar chamava-se Ana Tesa e vendia castanhas cozidas. A senhora transportava a púcara de barro preto com as castanhas cozidas debaixo de um xaile negro para elas não arrefecerem, só as destapando quando aparecia o cliente.

Na antevéspera do S. Martinho quem passava pelas casas de pasto ou tascas como lhe queiram chamar, via um ou dois porcos chamuscados abertos e dependurados para arrefecerem as carnes. Depois eram desfeitos na véspera donde se podia beber o perfume dos rojões feitos na ocasião do desmanche. Chegado o S. Martinho o focinho do animal com um ramo de loureiro era colocado à porta do estabelecimento como um certificado de carne fresca se tratasse, enquanto o resto rumava à cozinha para mais tarde ser servido com as canecas do vinho tirado da pipa ali mesmo à frente do nosso nariz.

Neste dia atrás do Cine-Teatro S. Martinho haviam as famosas tortas de bastos que por tal motivo alcunharam o dono e a casa por Coelho das Tortas.

Embora hoje em qualquer altura do ano apareçam em qualquer lugar roulottes a venderem farturas, no meu tempo de criança tal comezaina só aparecia pelo S. Martinho. Nesse tempo apenas três barracas apareciam: “O Casal”; “A Família Oliveira” e o “Couto das Farturas”. Não sei porquê nem porque não, o pessoal inclinava-se mais para as duas primeiras (que ainda hoje existem) em detrimento da terceira o Couto das Farturas. Mas acontece que este para se vingar permanecia para além das feiras anuais, sendo a malta nessa altura obrigada a adquirir o seu produto. Para o cúmulo do nosso apetite, andava um miúdo com um tabuleiro preso ao pescoço pelas ruas da cidade apregoando “Farturas à moda de Lisboa”.

Todos estes aromas foram perdidos, porque não só os seus donos desapareceram do rol dos vivos, como as respectivas casas deram lugar a novos ramos de negócio.

Como se vê, tudo se transforma com o tempo, menos o próprio tempo.