DA CONSOADA À MISSA DO GALO
DA
CONSOADA
À
MISSA DO GALO
Na
tarde do dia 24 de Dezembro, a família começa a chegar e as
mulheres reúnem-se na cozinha, enquanto os homens permanecem na
sala.
Durante
a tarde a azáfama era grande junto ao fogão, onde a doçaria começa
a sair quentinha.
São as rabanadas, a aletria, os mexidos, os filhoses, os sonhos e mais um ou outro bolo.
São as rabanadas, a aletria, os mexidos, os filhoses, os sonhos e mais um ou outro bolo.
Enquanto
isso se passa junto ao lume, o meu pai lá se vai encarregando do
vinho, da compra da broa, das regueifas para o Dia de Natal e de ir
buscar o bolo-rei já encomendado com tempo e horas ao Sr. Pedro da
mercearia com o seu nome, doçaria que só aparecia nesta quadra
natalícia.
Nesses
tempos idos, no interior do bolo-rei vinha uma fava e um brinde. Ora
acontece que enquanto todos queriam que lhe saísse o brinde, a fava
ninguém a desejava, pois segundo a tradição, quem a tivesse teria
que comprar o próximo bolo-rei.
Em
Penafiel, apenas dois estabelecimentos vendiam esta especiaria. Era a
Mercearia Pedro (na Praça Municipal), que vendia o Costa Moreira que
vinha da cidade do Porto, e o Café Capri, situado na Avenida Sacadura Cabral,
com a marca Paupério, confeccionado em Valongo.
Depois
era a cozedura das batatas, das pencas, dos ovos, dos nabos, das
cenouras e o bacalhau, que vinham para a mesa ainda a fumegar.
Por
vezes, ainda estávamos a cear, já à porta um grupo de miúdos nos
vinham cantar as Boas-Festas.
No
espaço temporal, que compreende o Natal aos Reis, existem três
tipos de cânticos, bem definidos no tempo e nos temas.
De
24 para 25 de Dezembro, são as Boas-Festas, em que se anuncia o
nascimento de Jesus, vejamos:
Boas-
Festas, Boas-Festas
Aqui
haja neste dia
Que
lhes manda o Rei do Céu
Com
prazer e alegria.
Boas-
Festas, Boas-Festas
Festas
de muita alegria
Que
nasceu o Deus Menino
Filho
da Virgem Maria.
… … … … … … …
… …
De
31 de Dezembro para o primeiro dia do Ano-Novo, entoam-se as
Janeiras.
Por
ser véspera de Ano-Novo
Vimos
cantar as Janeiras
Foi
nascido o Deus Menino
No
jardim das Oliveiras
Vinde-nos
dar as Janeiras
Se
no-las houverem de dar
Nós somos
de muito longe
Temos muito para andar
… … … … ….
…. ….
E
por fim os Reis na noite de 5 para 6 de Janeiro.
Por
hoje ser dia 5
Amanhã
ser dia 6
Vimos
dar as Boas- Festas
E
também cantar os Reis.
Aqui
vimos, aqui estamos
Meus
senhores bem o sabeis
Vimos
dar as Boas-Festas
E
também cantar os Reis.
Mas
voltemos onde estávamos. Terminada a bacalhoada, dava entrada na
mesa a doçaria, enquanto era feito café na chocolateira de barro, para
vencer o sono.
Enquanto
as mulheres lavavam a louça e os talheres utilizados, os homens
jogavam o quino para fazer horas para a Missa do Galo, e os mais
novos entretinham-se com o rapa, mas antes de o sono aparecer, iam
colocar um sapato junto à chaminé para o Pai-Natal lhes deixar uma
ou mais prendas no sapatinho.
Lá
vamos bem comidos e bebidos a caminho da Igreja Matriz, onde nos
sentamos num dos bancos do fundo do templo, e com os meus olhitos lá
vou gravando e seguindo a missa.
Ao
meu lado um homem com a voz avinhada, reza e canta em voz alta, não
se apercebendo das baforadas com odores alcalinos que lança sobre os
vizinhos.
O
sacerdote lá vai explicando o nascimento do Salvador do Mundo, que
desceu à Terra à 2019 anos, feito homem para nos salvar.
Que a expressão
Missa do Galo, vem da tradição segundo a qual à meia-noite do dia
24 de Dezembro um galo cantou mais alto que qualquer outro,
anunciando o nascimento do Menino Jesus.
Assim como o
galo anuncia o nascer do sol e seu canto preludia o amanhecer, assim
também a “Missa do Galo” comemora e canta o nascimento de Jesus,
o Sol nascente que, clareando a escuridão do pecado, veio nos remir.
Papa Xisto III |
A “Missa do Galo” foi celebrada pela primeira vez no século V pelo Papa Xisto III na então nova basílica de Santa Maria Maior
No
momento em que o padre eleva o cálice da consagração, todos se
ajoelham, e de cabeça baixa todos rezam tão baixinho, que apenas
Deus os deve escutar. Se poucos são os que vão tomar a hóstia
Sagrada, todo o mundo vai beijar o Menino, no final da Missa do Galo,
a única que no mundo católica se celebra ás zero horas.
Regressado
a casa, meu pai antes de recolher ao vale dos lençóis, vai
sorrateiramente colocar as prendas nos sapatinhos.
De
manhã toda a gente acorda com a algazarra da pequenada com as
prendas nas mãos.
Isto
tudo no tempo em que o meu Pai e a minha Mãe Natal, se sentavam à
mesa connosco.
Mas
enquanto um de nós for vivo, eles estarão sempre presentes, todos
os dias do resto das nossas vidas.
A
todos que por aqui passam, desejo-lhes um Santo e Feliz Natal e um Bom
Ano 2020.
Fernando
Oliveira – Furriel de Junho