06 abril 2016

FESTA DE CARIDADE NO PALACETE DO BARÃO DO CALVÁRIO



FESTA DE CARIDADE NO PALACETE
DO BARÃO DO CALVÁRIO


Sábado, 17 de Abril de 1915, realizou-se no palacete do Barão do Calvário um sarau de caridade promovido pela ex.ma sr.ª D. Isabel Silva, com a colaboração de outras distintíssimas amadoras.

O amplo salão do palacete do Calvário, encontrava-se repleto de senhoras e cavalheiros pertencentes à nossa primeira sociedade, sendo ainda grande o número de pessoas que ocupavam as salas próximas.


Abriu o concerto a Synfonia N.º 5 de Becthoven, maravilhosamente executada pelas ex.mas Sr.as D. Maria Ludovina de Mello e D. Isabel Silva, que souberam arrancar ao piano excelentes e perfeitíssimos gradações de sonoridade com deliciosos efeitos que só aos grandes concertistas estamos habituados a ouvir, com uma execução simplesmente magistral.



A ex.ma sr.ª D. Maria Ludovina de Mello Guimarães, fez-se ainda ouvir a solo na Claribel de Moore, e na sonata Pathétique de beethoven.Em ambas as peças revelou um grande talento.

A ex.ma sr.ª Isabel Silva mais uma vez afirmou o seu grande talento, executando de uma forma irrepreensível  e com o maior brilho o Rondo Capriccioso de Mendelssohn e a Phantasia Impromptu op. 66 de Chopin, e a Rapsodia Hungara N.º 11 de Liszt. Este último trecho foi verdadeira chave d'ouro ao magnífico concerto, e em vista da grande ovação que merecidamente lhe foi feita, a ilustre amadora e promotora desta bela festa, tocou gentilmente extra programa a Dança das Sombras, pequena mas graciosa página musical, que foi executada com inexcedível mimo e delicadeza.


A ex.ma sr,ª D. Adriana Mendes de Vasconcellos, tocou primorosamente o Jour de Noces de Griez, Impromptu op. 4 de Schubert, e o final da Sonata N.º1 de Beethoven, mostrando em todos os trechos possuir já, apesar da sua pouca idade, uma técnica admirável e uma fina sensibilidade artística.

Efectivamente, só tendo adquirido à força de talento e de estudo um grande conhecimento do teclado, poderia desempenhar-se tão notavelmente, sem esforço aparente dos trechos difíceis que executou.


 O mesmo dizemos da ex.ma sr.ª D, Maria da Natividade Brito, que tocou de um modo impecável as Valsas nº 6 e 14 de Chopin, a Pantomina de Moszkowski e o Gazouillement du Printemps de Sinding.

Nestes trechos de índoles tão diferentes, mostrou-nos a distinta amadora a maleabilidade do seu belo talento, e podemos afoitamente afirmar que raras vezes ouvimos dar à Valsa n.º 14 de Chopin uma execução tão perfeita e tão sentida como aquela que a D. Maria da Natividade Brito lhe deu.


Também a menina D. Maria Ignez Soares, revelou o seu precoce talento na forma primorosa como executou o Minueto de Griez e as Melodias N.º 2 e 18 de Stephen Heller.


Dos números mais brilhantes do escolhidíssimo programa, os que mais efeitos produziram foram sem dúvida os coros a duas vozes em que tomaram parte as ex.mas sr,ªs D. Alves Ramos, D. Alzira Mello, D. Anna Carvalho, D. Carolina Abrantes Ferreira, D. Maria Alice da Silva, D. Maria Antonieta Cruz, D. Maria Augusta Guimarães, D. Maria da Graça Brandão, D. Maria da Graça Veiga, D. Maria do Carmo Ramos, D. Maria Ignez Soares, D. Maria Leopoldina Baptista, D. Maria Ferreira Abrantes, D. Othília Maria Veiga, D. Rita Abrantes Ferreira, D. Rosalina Brandão e D. Zulmira Alves.

Estes coros, de uma afinação impecável e rara precisão, foram ouvidos com o maior agrado pelo selecto auditório que se não cansou de aplaudir as jovens artistas e as sua proficientes ensaiadoras, ex.mas senhoras D. Maria Thereza de Vasconcellos e D. Isabel Silva.



Tanto no Idyllio Campreste do Dr. António Vianna, como nas Quadras Soltas e Alleluia de Fernando Moutinho, assim como nas Canções do mar bravo e das Ceifeiras, em que toda a sala vibrou de entusiasmo pela maneira encantadora como essas complicadas composições foram cantadas, mas de todos os trechos aquele que mais agrado produziu foi inquestionavelmente o fado Saudade de Menino cantado extra programa.

Propositadamente deixamos para o fim a nossa impressão sobre os dois números de canto deliciosamente preenchidos pela ex.ma sr.ª D. Maria Thereza de Vasconcellos, exactamente por serem daqueles que mais profunda e agradável sensação nos deixaram d'essa memorável consagração d'arte.

Esta senhora, que possui uma bem timbrada voz de soprano, cantou com inexcedível perfeição e sentimento uma Romanza de Campana e uma Melodia de Tosti, electrizando a assistência que lhe fez uma bem merecida e espontânea ovação.

Todas as ilustres amadoras foram, como era de justiça, delirantemente aplaudidas sendo oferecido à ex.ma sr.ª D. Isabel Silva um lindo bouquet de flores artificiais com uma preciosa estatueta de Beethoven, pelas suas discípulas ex.mas sr,ªs D. Maria Ludovina Mello, D. Adriana Mendes de Vasconcellos e D. Maria da Natividade de Brito, e outro bouquet de flores naturais pelas senhoras que tomaram parte nos coros, e à ex-ma sr.ª D. Maria Thereza de Vasconcellos, um bouquet de flores naturais pela ex-ma sr.ª D. Maria da Conceição Baptista e outro bouquet de flores artificiais pelas senhoras que tomaram parte nos coros.

O produto desta festa, que primitivamente era destinado exclusivamente à Delegação da Sociedade Portuguesa da Cruz Vermelha desta cidade, foi pela ilustre promotora D. Isabel Silva com pleno acordo desta Delegação,  também partilhado pela Associação dos Bombeiros Voluntários, fazendo-se ambas estas beneméritas corporações representar por piquetes dos seus corpos activos, devidamente uniformizados, que fizeram em comum o serviço da recepção dos bilhetes e entrega dos programas.

Apresentação das contas:

Venda de 154 cadeiras a $50 - 77$00
A deduzir:
Impressos ----------------- 5$20
Luz eléctrica ------- -----  2$00
Para a fazenda ----------   1$50
Afinação de um piano -   2$50
Carpinteiro e transporte - 2$50
Papel selado e selos -----    $30

Líquido ------------------- 63$00

Assim foi entregue ao Sr, Luiz Carlos de Chatillon a quantia de 63$00, produto liquido da referida festa de caridade, pertencendo metade à Delegação da Cruz Vermelha e a outra metade à Associação dos Bombeiros Voluntários de Penafiel.

A Direcção dos Bombeiros Voluntários enviou à Sr.ª D. Isabel Silva o seguinte ofício:

Excelentíssima Senhora D, Isabel Silva

Encarrega-me a Associação dos Bombeiros Voluntários desta cidade, a cuja direcção tenho a honra de presidir, de ser interprete dos seus sentimentos de gratidão e reconhecimento, junto de V. Ex.ª, pela infinita bondade e suprema gentileza de que deu provas, mandando entregar no cofre da referida Associação, metade do produto do sarau por V. Ex.ª levado a efeito e que, com justiça para a Senhora que o organizou, e para todas as que nele cooperaram, foi coberto de brilhantíssimo êxito.

Bem hajam V. Ex.ª e todas as suas ilustres colaboradoras, e permitam-me ainda que, ao reiterar-lhes também o meu agradecimento individual, beije com respeito e afecto as mãos generosas que à Associação dos Bombeiros Voluntários de Penafiel acabam de dispensar tão valioso auxílio.

Penafiel, 26 de Abril de 1915

O Presidente da Direcção

Vasco Teixeira d'Araújo Mello de Queiroz

Todas as senhoras que tomaram parte da elegantíssima festa, foram fotografadas no atelier do conhecido fotógrafo Sebastião Borges.