UMA FESTA EM CASAIS NOVOS
UMA
FESTA EM CASAIS NOVOS
No dia 15 de Setembro
de 1913, na casa do Sr. Conselheiro Joaquim de Vasconcellos (Carvalho), em
Casais Novos, Penafiel, para comemorar o aniversário natalício da senhora Dona
Maria Júlia de Meyrelles Gouveia, realizou-se uma elegante festa, em sua
homenagem, iniciativa dos sobrinhos desta distinta senhora.
Do programa cultural
constava o seguinte:
Ás 22 horas em ponto, principiou o sarau,
sendo o programa rigorosamente cumprido.
A Marche du Tannhauser
de Wagner, distintamente executado pelo quinteto, e a Zara, apreciável drama em
verso do Sr. Padre Donaciano d'Abreu Freire, em que o seu autor, aproveitando
com felicidade a reconquista da Península pelos cristãos, fez ressaltar em
versos de emocionante lirismo, um episódio de amor em que esplende, fulgida e
comovedora, a infinita bondade de duas almas que para a vida e para a morte
se afeiçoaram e prenderam uma à outra.
Zara, ardente filha do
deserto, vinda de um país onde o sol põe fogo no olhar e nas paixões, e
Florinda, a personificação feliz do amor resignado, ocultando na sombra do
convento o coração, que uma ilusão desfeita amortalhou de luto.
De Zara, transcrevemos
para aqui um texto da última cena, onde a coragem moral de uma virgem cristã se
manifesta e sublima, num piedoso gesto de renúncia:
E bem assim os demais
números do programa, a destacar um delicioso texto de Rossini, em harmónio e
piano, pela sr.ª D. Maria Antónia de V. Gouveia e Olinda Moreira, e o alegretto
de Schubert, executado com rara perfeição pela sr.ª D. Maria do Carmo de V. e
Menezes, que fechou com chave de ouro a segunda parte do sarau.
Seguidamente à parte
literária e musical, passaram os convidados a nova sala, profusamente iluminada
e decorada, numa formosa disposição artística, onde as manchas coloridas de
begónias tuberosas, fazendo realçar as pratas e os cristais, se combinavam num
conjunto deslumbrante.
Aí foi servida uma ceia
volante, primorosa, como tudo o em que preside a gentileza e o bom gosto dos
ilustres donos da casa de Casais.
Após a ceia começou o
baile, que se prolongou até ás quatro da madrugada com invulgar animação.
A Sr.ª D. Bertha de
Lemos Peixoto, filha do sr. Dr. José Augusto de Lemos Peixoto, cantou com
intuição de artista, em português e em italiano, sendo muito aplaudida pela
distinta assistência.
O sr. Dr. Ruella Ramos,
mostrando apreciáveis dotes de declamação, recitou uns formosos versos de
Eduardo Coimbra, recebendo muitos aplausos.
De certeza quem teve a
felicidade de assistir a este convívio, certo que nunca esqueceu as elevadas
horas de prazer espiritual ali vividas, entre sorrisos e flores, numa atmosfera
de sonho, nesse recanto privilegiado d'Entre Douro-e-Minho, por onde já cantou
as suas mágoas o magoado poeta António Nobre, e também nunca esqueceu a fidalga
hospitalidade do Sr. Conselheiro Joaquim de Vasconcellos e de sua virtuosa
esposa, a Sr.ª D. Maria Francisca de Meyrelles Gouveia.
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