30 março 2016

UMA FESTA EM CASAIS NOVOS



UMA FESTA EM CASAIS NOVOS


No dia 15 de Setembro de 1913, na casa do Sr. Conselheiro Joaquim de Vasconcellos (Carvalho), em Casais Novos, Penafiel, para comemorar o aniversário natalício da senhora Dona Maria Júlia de Meyrelles Gouveia, realizou-se uma elegante festa, em sua homenagem, iniciativa dos sobrinhos desta distinta senhora.


Do programa cultural constava o seguinte:



 Ás 22 horas em ponto, principiou o sarau, sendo o programa rigorosamente cumprido.


A Marche du Tannhauser de Wagner, distintamente executado pelo quinteto, e a Zara, apreciável drama em verso do Sr. Padre Donaciano d'Abreu Freire, em que o seu autor, aproveitando com felicidade a reconquista da Península pelos cristãos, fez ressaltar em versos de emocionante lirismo, um episódio de amor em que esplende, fulgida e comovedora, a infinita bondade de duas almas que para a vida e para a morte se  afeiçoaram e prenderam uma à outra.


Zara, ardente filha do deserto, vinda de um país onde o sol põe fogo no olhar e nas paixões, e Florinda, a personificação feliz do amor resignado, ocultando na sombra do convento o coração, que uma ilusão desfeita amortalhou de luto.


De Zara, transcrevemos para aqui um texto da última cena, onde a coragem moral de uma virgem cristã se manifesta e sublima, num piedoso gesto de renúncia:






E bem assim os demais números do programa, a destacar um delicioso texto de Rossini, em harmónio e piano, pela sr.ª D. Maria Antónia de V. Gouveia e Olinda Moreira, e o alegretto de Schubert, executado com rara perfeição pela sr.ª D. Maria do Carmo de V. e Menezes, que fechou com chave de ouro a segunda parte do sarau.

Seguidamente à parte literária e musical, passaram os convidados a nova sala, profusamente iluminada e decorada, numa formosa disposição artística, onde as manchas coloridas de begónias tuberosas, fazendo realçar as pratas e os cristais, se combinavam num conjunto deslumbrante.

Aí foi servida uma ceia volante, primorosa, como tudo o em que preside a gentileza e o bom gosto dos ilustres donos da casa de Casais.

Após a ceia começou o baile, que se prolongou até ás quatro da madrugada com invulgar animação.

A Sr.ª D. Bertha de Lemos Peixoto, filha do sr. Dr. José Augusto de Lemos Peixoto, cantou com intuição de artista, em português e em italiano, sendo muito aplaudida pela distinta assistência.

O sr. Dr. Ruella Ramos, mostrando apreciáveis dotes de declamação, recitou uns formosos versos de Eduardo Coimbra, recebendo muitos aplausos.


De certeza quem teve a felicidade de assistir a este convívio, certo que nunca esqueceu as elevadas horas de prazer espiritual ali vividas, entre sorrisos e flores, numa atmosfera de sonho, nesse recanto privilegiado d'Entre Douro-e-Minho, por onde já cantou as suas mágoas o magoado poeta António Nobre, e também nunca esqueceu a fidalga hospitalidade do Sr. Conselheiro Joaquim de Vasconcellos e de sua virtuosa esposa, a Sr.ª D. Maria Francisca de Meyrelles Gouveia.