15 fevereiro 2015

FAUSTO



FAUSTO


De seu nome, Carlos Fausto Bordalo Gomes Dias nasceu a 26 de Novembro de 1948 no navio “Pátria”, entre Lisboa e Angola.

Em Nova Lisboa, onde passou a infância e adolescência, começou a interessar-se e assimilou os ritmos africanos ouvindo principalmente os conjuntos, “África Ritmos” e o “Conjunto do Ferrovia”, a que juntaria mais tarde, os das suas origens lusas.

Começou muito novo a tocar em grupos de baile na então Nova Lisboa. 


Num concurso disputado no Atlético em 1964, “Os Zorbas” com o Fausto e o Rufino (Mike) à viola, o Bino na bateria, o João Leitão no baixo e o Fernando Campas Nunes nas teclas arrebataram o primeiro prémio.


Fausto, que ao tempo era conhecido por Carlitos, tocava música pop nos “Rebeldes”, com Vicky Paes Martins, Matos Carlos, Manuel Luis e Toni Matos. Foi o conjunto que mais furor fez ao tempo na cidade, e abandona-o no fim dos anos sessenta (1968) quando embarca para a então Metrópole para estudar no ISCPU (Instituto de Ciências Sociais e Política Ultramarina).



Em Lisboa começa a aproximar-se de Adriano Correia de Oliveira, a quem tinha sido apresentado por Manuel Freire, José Afonso, Francisco Fanhais e José Jorge Letria, remanescente dos chamados “baladeiros” da música portuguesa saídos do anonimato pelo desempenho no “Zip-Zip”, programa que revelou também o angolano Ruy Mingas.

Empenhado no movimento estudantil é eleito em 1972 presidente da direção da Associação de Estudantes do ISCPU, mas por informações da PIDE o ministério da Educação não homologa o seu nome sendo o normal vetar toda a lista. 

Apesar do bom aproveitamento académico, Fausto é mobilizado para o exército colonial e, não se apresentando, iniciou assim um período de clandestinidade no interior de Portugal.


Fausto, na esteira de outro homem do Huambo, Luís Cília, que esteve exilado desde 1964 em França, começou a participar ativamente em movimentos antifascistas e anticolonialistas e passou a fazer da canção um instrumento de protesto contra a guerra colonial e uma intervenção ativa pela liberdade e pela melhoria das condições de vida da população portuguesa.

Começou a musicar alguns poetas proscritos pelas autoridades como foi o caso do Viriato da Cruz, António Jacinto, Mário António e Daniel Filipe entre outros. O “Namoro” do Viriato, o “Comboio Malandro” do Jacinto e “Poema da Farra” de Mário António, ainda hoje cantados por pessoas de gerações que já nem se lembram, felizmente, como eram as coisas há quase quarenta anos, em que só à surdina se podia trautear certas músicas e certos poemas. 


Com o advento da democracia em Portugal, em 25 de Abril de 1974, Fausto Bordalo Dias multiplica-se em cantos livres e espetáculos a acompanhar Zeca Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Vitorino, Sérgio Godinho, etc. 

A cantiga passou a ser uma arma de intervenção na consciencialização das pessoas na construção de uma democracia sem o obstáculo da guerra colonial e da opressão ideológica e política. 


Em Angola reúne-se com Ruy Mingas, Zeca e Adriano e fazem um memorável canto-livre, em Abril de 1975, numa Cidadela a rebentar pelas costuras, numa ação de apoio ao MPLA. 

Quando fazem uma sessão na cantina da universidade, junto à ermida da Nazaré, a FNLA, acolitada por alguns colonos enfurecidos, cercam a zona e só por sorte todos acabaram por sair ilesos, tendo sido então pedida a sua expulsão do território. 

Com o correr dos anos fomo-lo vendo participar invariavelmente associado a movimentos cívicos, e a “fabricar” canções que deram uma vivacidade a momentos de grande fulgor das pessoas que empenhadamente se organizavam na defesa da democracia participada.

Foram entretanto saindo discos de “intervenção” com uma riqueza instrumental que era inabitual, pelo facto deste tipo de canção não possibilitar muita disponibilidade para um trabalho aturado, fruto do imediatismo a que estavam sujeitas as histórias que urgiam ser “cantadas”. 


1970 - Surge o seu primero LP com o título do seu próprio nome “Fausto”. 


1974 - O “Pró que der e vier” (1974),trabalho quase todo feito no seus tempos de semiclandestinidade.


1975 - “Bêco com saída”.  


1977 - “Madrugada dos Trapeiros”.


1979 - Com a dificuldade que os cantores de intervenção vão passando junto da rádio, Fausto, que entretanto se licenciou em Ciências Sociais e Políticas, faz sair provavelmente o seu trabalho menos conhecido, mas de grande qualidade: “História de Viageiros”, um trabalho feito com base na “Peregrinação” de Fernão Mendes Pinto, que serviu de tema musical para o grupo de teatro “A Barraca”, na peça “ Fernão Mendes…”


1982 – “ Por este rio Acima” o melhor algum da Música Popular Portuguesa, realizado até aos dias de hoje. Este é o primeiro álbum da trilogia sobre a diáspora portuguesa. 


1985 -  O “Despertar dos Alquimistas”.


1987 - “Para Além das Cordilheiras”.


1989 - Em colaboração com o músico angolano Mário Rui Silva, que primorosamente o acompanha à viola, fazem um trabalho publicado entretanto, “A preto e branco”, com sonoridades africanas em que Fausto revisita os seus tempos dos catorze aos vinte anos, onde reaprende músicas esquecidas e recupera sonoridades já no baú das suas recordações de musicalidades perdidas num Huambo distante.
“Fausto simbolizará, como Herberto Helder ou José Régio…, a alma por onde todo o nosso mundo de sensações e sentimentos navega nas horas que a perenidade do nosso coração determina”.


1997 - “Crónicas da Terra Ardente” de 1997, o segundo disco da trilogia sobre a diáspora portuguesa.


2003 - A “Ópera mágica do cantor maldito”.


2011 - “Em busca das montanhas azuis”, trinta anos depois de iniciar a trilogia da diáspora, de acordo com os prazos de 10 em 10 anos que a si próprio se impôs, foram os trabalhos em que se empenhou para além de múltiplos projetos com muitos artistas. Este disco atinge o primeiro lugar do top nacional de vendas logo na primeira semana. «Em Busca das Montanhas Azuis» é o título do álbum que colocou o compositor no topo da tabela de vendas, pela primeira vez na carreira de Fausto Bordalo Dias é atingido o primeiro lugar do top de vendas. É o reconhecimento pelo público do grande valor artístico de uma obra incomparável, patente neste novo disco, que encerra a trilogia. 




Com Fausto, é toda uma viagem pelo universo dos sons, da memória colectiva, do sentir mais profundo que nos une enquanto comunidade(s).

Vamos ficar com “Oh pastor que choras”, do seu primeiro LP Fausto de 1970. Afinal de contas, ontem como hoje, “carneiros é o que mais há”.





-Bom domingo!