O INCÊNDIO NO MOSTEIRO DE PAÇO DE SOUSA
O
INCÊNDIO
NO
MOSTEIRO DE PAÇO DE SOUSA
Paço de Sousa, 9 de
Março de 1927, quarta-feira pelas 4h30m da madrugada, manifestou-se um violento
incêndio, no antigo e histórico convento de Paço de Sousa.
Desde princípio, o
incêndio tomou grande incremento, devido ao forte vento que fazia sentir.
Dado o sinal de alarme
pelo guarda-nocturno da Casa Pia, Sr. Joaquim de Sousa, quando ele já envolvia
algumas dependências da referida Casa.
Imediatamente compareceram
os bombeiros voluntários de Cete e muitos populares, que trabalharam com denodo
na sua extinção, porém, baldados foram todos os seus esforços perante a violência
de que se fazia revestir.
Estabeleceu-se grande pânico
entre toda a enorme mole de gente, ao ver que já nada impedia a destruição do
velho convento, relíquia de um passado, que a história perpectuará.
Tudo o que era pertença
sua ficou destruído, restando apenas de pé, embora abaladas nos seus alicerces,
as grossas colunatas de pedra que o constituem, em estilo arquitectónico.
Até os sinos foram
atingidos, bem como o relógio que se encontrava colocado no frontispício, tendo
ficado tudo bastante danificado.
Todo o travejamento e
telhado ruíram por completo, não ficando sequer sombras da sua existência. Na
parte interior, queimou-se um altar, diversas alfaias religiosas e toda a parte
destinada ao coro e respectiva escadaria, tendo ficado intacto o altar
principal, onde aos domingos se celebrava a respectiva missa.
A urna onde se encontravam
as ossadas de Egas Moniz nada sofreu, tendo-se queimado apenas as grades de
madeira que, a circundavam.
Por todo o vasto
recinto do referido convento viam-se dispersos vários destroços do seu vasto
recheio, que, ao serem contemplados, despertavam certa tristeza. Os prejuízos são
avaliados em muitas dezenas de contos.
Na Casa Pia ficaram destruídas
por completo a sala de escola e a rouparia que lhe ficavam anexa, bem como o salão
de entrada que comunicava com a secretaria, não se tendo propagado o fogo a
todo o edifício, devido à intervenção dos Bombeiros de Entre-os-Rios e Paredes,
que foram incansáveis em dedicação para tal conseguir.
Merecem porém,
referência especial, todos os bombeiros das corporações que tomaram parte na
extinção do incêndio, que, não obstante, os perigos com que muitas vezes tiveram
de defrontar-se, se mostraram à altura do cumprimento dos seus deveres. Também
compareceram os Bombeiros Voluntários Portuenses e Municipais, que poucos
serviços chegaram a prestar, em virtude de já terem chegado tarde.
Ignoram-se as causas do
pavoroso incêndio, não se sabendo se partiria da Casa Pia ou da igreja do
convento. Não compareceram os Bombeiros Voluntários de Penafiel, em virtude de
não chegarem a ser requisitados os seus serviços. Os prejuízos na Casa Pia são
também contabilizados em dezenas de contos. Não se deram quaisquer desastres
pessoais.
Bispo do Porto Dom António Barbosa Leão |
Tem sido avultado o
número de pessoas que ali vão admirar o completo estado de destruição. No último
dia 12 do corrente esteve, naquela
freguesia, em sua visita, sua reverendíssima D. António Barbosa Leão, Bispo do Porto,
sendo acompanhado desde a estação de Cete por grande número de pessoas, que lhe
prestou as maiores homenagens. Junto ao altar-mor que ficou intacto, proferiu
uma breve alocução, tendo apelado para os sentimentos generosos de toda a assistência,
a fim de contribuir para a reconstrução do aludido mosteiro, reduzido pelas
chamas a escombros. Sua rev.ª contribuiu com 5.000$00 e o pároco daquela
freguesia com 2.000$00. São dois importantes donativos, que servirão de exemplo
para que outros os imitem. No último domingo já se celebrou a respectiva missa
na parte que ficou intacta. O rev. abade daquela freguesia, dirigiu a todos os
padres de Portugal o apelo que abaixo transcrevermos, afim de ser reedificado o
mosteiro, verdadeira obra de arte:
“Uma enorme desgraça
acaba de ferir durante o bom povo - o povo sinceramente piedoso e crente de Paço
de Sousa, que paroqueio, e dilacerou cruelmente o meu coração de padre e de português!…
Na madrugada do dia 9
do corrente mês de Março, um pavoroso incêndio atingiu a nossa Igreja
Paroquial, maravilha da arte românica em Portugal, joia preciosíssima de subido
valor histórico, artístico, e arqueológico!... O que era, para nós, há pouco, o
nosso orgulho de crentes, o nosso enlevo e o nosso encanto de portugueses, é
hoje um montão de destroços, causa desta dor ferina que nos angustia!...
Somos como a mãe que, há
momentos, acarinhava o seu filhinho - vida sua vida - e que, num repente, o viu
mutilado e morto por uma fera bravia!...
Mas, essa mãe, dentro
em breve, tem a tampa, embora gelada, da sepultura, a retirar de seus olhos
espavoridos este quadro de horror, que a enlouquece... Enquanto que, aquelas
ruinas, estão bem patentes a nossos olhos, e ferem a nossa alma, como punhais cravados!...
Na minha vida, que já é
bem longa, duas imensas mágoas entraram no meu coração e cá moram ainda:
primeira - não ter podido despedir-me de minha santa mãe que está no céu, dando-lhe,
num último beijo, o último adeus: segunda - por, em virtude duma curta ausência
a visitar uma pessoa de minha família enferma, em Arouca, não poder assistir à catástrofe,
afim de, também, e como pudesse, defender do fogo a minha igreja que amo tanto,
tanto!...
Minha querida mãe não
mais pude vê-la ressuscitada!... Mas, esta segunda mãe, a minha igreja tão linda,
hei-de vê-la, dentro em breve, - creio em Deus e na Virgem Santíssima - restaurada,
e, talvez, mais bela ainda!...
Após a noite, a
madrugada... Após a tormenta o arco-íris da Esperança!...
Como monumento nacional
de inapreciável valor histórico, artístico e arqueológico o Estado subsidiará a
restauração do que é, propriamente, histórico e arqueológico...
Mas, não lhe sendo possível
ir mais além, tem o povo de fazer o resto, que não é pouco!..
Mas quê!... O povo, o
povo bom desta terra que, ainda há bem pouco tempo, gastou tanto dinheiro em reparações
de soalho, paramentos, etc., está esgotado de recursos, embora não o esteja da
boa vontade, que sempre lhe assiste, na prática do bem...
Irmãos queridíssimos no
Sacerdócio e na Paroquialidade, venho pedir-vos, em nome do Bom Deus que,
adoramos, um sacrifício que a minha alma e a alma de meus bons paroquianos
relembrará sempre, reconhecidamente agradecida!....
Peço-vos que venhais em
nosso auxílio, contribuindo voluntariamente, sendo, assim, solidários na nossa
dor, com a esmola do Santo Sacrifício da missa que celebrardes no próximo dia
24 do corrente mês de Março, dia em que a Santa Igreja comemora a Instituição
do Santíssimo Sacramento da Eucaristia - o terno Amigo da Humanidade, cuja
moradia, sobre a terra, o fogo não quis respeitar!...
É também, dia de S.
Gabriel Arcanjo, doce Mensageiro da Boa Nova da Redenção, e que oxalá!... seja
também o Mensageiro, para nós, da Boa Nova da vossa preciosa esmola, do vosso
generoso sacrifício!... Oxalá!... “
Os vossos donativos podeis
mandá-los para o rev.° senhor Padre Miguel de Oliveira, rua Garrett, 29 2.°,
Lisboa: ou para o rev.° senhor Padre António Brandão, Secretario geral do Centro
Católico, rua Capelo. 5-2.°-E-Lisboa; para o Jornal de Noticias, do Porto, ou
ainda para este vosso colega obrigadíssimo. Padre Manuel Gomes de Castro, Abade
de Paço de Sousa—Linha do Douro.
2 Comments:
Boa tarde,
Estive a ver esta publicação e gostaria de saber de possui mais alguma informação sobre o Padre Manuel Gomes de Castro?
Sou o bisneto do mesmo e ando a recolher o máximo de informações para uma compilação genealógica.
Ricardo Coutinho
Tenho outro texto que talvez encontre mais alguma coisa de interessante sobre o assunto. Ver:http://penafielterranossa.blogspot.pt/search?q=O+renascer+das+cinzas
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