01 outubro 2014

O INCÊNDIO NO MOSTEIRO DE PAÇO DE SOUSA



O INCÊNDIO
NO MOSTEIRO DE PAÇO DE SOUSA


Paço de Sousa, 9 de Março de 1927, quarta-feira pelas 4h30m da madrugada, manifestou-se um violento incêndio, no antigo e histórico convento de Paço de Sousa. 

Desde princípio, o incêndio tomou grande incremento, devido ao forte vento que fazia sentir. 


Dado o sinal de alarme pelo guarda-nocturno da Casa Pia, Sr. Joaquim de Sousa, quando ele já envolvia algumas dependências da referida Casa. 

Imediatamente compareceram os bombeiros voluntários de Cete e muitos populares, que trabalharam com denodo na sua extinção, porém, baldados foram todos os seus esforços perante a violência de que se fazia revestir. 


Estabeleceu-se grande pânico entre toda a enorme mole de gente, ao ver que já nada impedia a destruição do velho convento, relíquia de um passado, que a história perpectuará.

Tudo o que era pertença sua ficou destruído, restando apenas de pé, embora abaladas nos seus alicerces, as grossas colunatas de pedra que o constituem, em estilo arquitectónico.
Até os sinos foram atingidos, bem como o relógio que se encontrava colocado no frontispício, tendo ficado tudo bastante danificado. 



Todo o travejamento e telhado ruíram por completo, não ficando sequer sombras da sua existência. Na parte interior, queimou-se um altar, diversas alfaias religiosas e toda a parte destinada ao coro e respectiva escadaria, tendo ficado intacto o altar principal, onde aos domingos se celebrava a respectiva missa. 

A urna onde se encontravam as ossadas de Egas Moniz nada sofreu, tendo-se queimado apenas as grades de madeira que, a circundavam. 


Por todo o vasto recinto do referido convento viam-se dispersos vários destroços do seu vasto recheio, que, ao serem contemplados, despertavam certa tristeza. Os prejuízos são avaliados em muitas dezenas de contos. 

Na Casa Pia ficaram destruídas por completo a sala de escola e a rouparia que lhe ficavam anexa, bem como o salão de entrada que comunicava com a secretaria, não se tendo propagado o fogo a todo o edifício, devido à intervenção dos Bombeiros de Entre-os-Rios e Paredes, que foram incansáveis em dedicação para tal conseguir.


Merecem porém, referência especial, todos os bombeiros das corporações que tomaram parte na extinção do incêndio, que, não obstante, os perigos com que muitas vezes tiveram de defrontar-se, se mostraram à altura do cumprimento dos seus deveres. Também compareceram os Bombeiros Voluntários Portuenses e Municipais, que poucos serviços chegaram a prestar, em virtude de já terem chegado tarde. 



Ignoram-se as causas do pavoroso incêndio, não se sabendo se partiria da Casa Pia ou da igreja do convento. Não compareceram os Bombeiros Voluntários de Penafiel, em virtude de não chegarem a ser requisitados os seus serviços. Os prejuízos na Casa Pia são também contabilizados em dezenas de contos. Não se deram quaisquer desastres pessoais.

Bispo do Porto Dom António Barbosa Leão

Tem sido avultado o número de pessoas que ali vão admirar o completo estado de destruição. No último dia  12 do corrente esteve, naquela freguesia, em sua visita, sua reverendíssima D. António Barbosa Leão, Bispo do Porto, sendo acompanhado desde a estação de Cete por grande número de pessoas, que lhe prestou as maiores homenagens. Junto ao altar-mor que ficou intacto, proferiu uma breve alocução, tendo apelado para os sentimentos generosos de toda a assistência, a fim de contribuir para a reconstrução do aludido mosteiro, reduzido pelas chamas a escombros. Sua rev.ª contribuiu com 5.000$00 e o pároco daquela freguesia com 2.000$00. São dois importantes donativos, que servirão de exemplo para que outros os imitem. No último domingo já se celebrou a respectiva missa na parte que ficou intacta. O rev. abade daquela freguesia, dirigiu a todos os padres de Portugal o apelo que abaixo transcrevermos, afim de ser reedificado o mosteiro, verdadeira obra de arte: 


“Uma enorme desgraça acaba de ferir durante o bom povo - o povo sinceramente piedoso e crente de Paço de Sousa, que paroqueio, e dilacerou cruelmente o meu coração de padre e de português!…
Na madrugada do dia 9 do corrente mês de Março, um pavoroso incêndio atingiu a nossa Igreja Paroquial, maravilha da arte românica em Portugal, joia preciosíssima de subido valor histórico, artístico, e arqueológico!... O que era, para nós, há pouco, o nosso orgulho de crentes, o nosso enlevo e o nosso encanto de portugueses, é hoje um montão de destroços, causa desta dor ferina que nos angustia!...
Somos como a mãe que, há momentos, acarinhava o seu filhinho - vida sua vida - e que, num repente, o viu mutilado e morto por uma fera bravia!...
Mas, essa mãe, dentro em breve, tem a tampa, embora gelada, da sepultura, a retirar de seus olhos espavoridos este quadro de horror, que a enlouquece... Enquanto que, aquelas ruinas, estão bem patentes a nossos olhos, e ferem a nossa alma, como punhais cravados!...
Na minha vida, que já é bem longa, duas imensas mágoas entraram no meu coração e cá moram ainda: primeira - não ter podido despedir-me de minha santa mãe que está no céu, dando-lhe, num último beijo, o último adeus: segunda - por, em virtude duma curta ausência a visitar uma pessoa de minha família enferma, em Arouca, não poder assistir à catástrofe, afim de, também, e como pudesse, defender do fogo a minha igreja que amo tanto, tanto!...
Minha querida mãe não mais pude vê-la ressuscitada!... Mas, esta segunda mãe, a minha igreja tão linda, hei-de vê-la, dentro em breve, - creio em Deus e na Virgem Santíssima - restaurada, e, talvez, mais bela ainda!...
Após a noite, a madrugada... Após a tormenta o arco-íris da Esperança!...
Como monumento nacional de inapreciável valor histórico, artístico e arqueológico o Estado subsidiará a restauração do que é, propriamente, histórico e arqueológico...
Mas, não lhe sendo possível ir mais além, tem o povo de fazer o resto, que não é pouco!..
Mas quê!... O povo, o povo bom desta terra que, ainda há bem pouco tempo, gastou tanto dinheiro em reparações de soalho, paramentos, etc., está esgotado de recursos, embora não o esteja da boa vontade, que sempre lhe assiste, na prática do bem...
Irmãos queridíssimos no Sacerdócio e na Paroquialidade, venho pedir-vos, em nome do Bom Deus que, adoramos, um sacrifício que a minha alma e a alma de meus bons paroquianos relembrará sempre, reconhecidamente agradecida!....
Peço-vos que venhais em nosso auxílio, contribuindo voluntariamente, sendo, assim, solidários na nossa dor, com a esmola do Santo Sacrifício da missa que celebrardes no próximo dia 24 do corrente mês de Março, dia em que a Santa Igreja comemora a Instituição do Santíssimo Sacramento da Eucaristia - o terno Amigo da Humanidade, cuja moradia, sobre a terra, o fogo não quis respeitar!...
É também, dia de S. Gabriel Arcanjo, doce Mensageiro da Boa Nova da Redenção, e que oxalá!... seja também o Mensageiro, para nós, da Boa Nova da vossa preciosa esmola, do vosso generoso sacrifício!... Oxalá!... “



Os vossos donativos podeis mandá-los para o rev.° senhor Padre Miguel de Oliveira, rua Garrett, 29 2.°, Lisboa: ou para o rev.° senhor Padre António Brandão, Secretario geral do Centro Católico, rua Capelo. 5-2.°-E-Lisboa; para o Jornal de Noticias, do Porto, ou ainda para este vosso colega obrigadíssimo. Padre Manuel Gomes de Castro, Abade de Paço de Sousa—Linha do Douro.

2 Comments:

Blogger Ricardo Coutinho said...

Boa tarde,

Estive a ver esta publicação e gostaria de saber de possui mais alguma informação sobre o Padre Manuel Gomes de Castro?

Sou o bisneto do mesmo e ando a recolher o máximo de informações para uma compilação genealógica.

7:26 da tarde  
Blogger Fernando Oliveira said...

Ricardo Coutinho
Tenho outro texto que talvez encontre mais alguma coisa de interessante sobre o assunto. Ver:http://penafielterranossa.blogspot.pt/search?q=O+renascer+das+cinzas

11:13 da tarde  

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