O FERREIRO MANUEL ARRISCADO
O
FERREIRO
MANUEL
ARRISCADO
Em
tempos que já lá vão, na cidade e concelho de Penafiel, havia
muitos artífices que trabalhavam o ferro.
O
grande fole de cabedal ligado à forja para avivar o lume onde
crepitava o carvão vegetal, que servia para aquecer o ferro até
este ficar em brasa, que depois era trabalhado na bigorna ou no torno
pelo ferreiro.
A
música do martelo sobre a bigorna, marcava o ritmo do trabalho.
Quem
percorre as ruas da cidade de Penafiel, pode admirar as formas e os
feitios das varandas e portões em ferro do velho casario.
Ainda
hoje aparece no dia do Corpo de Deus, o Baile dos Ferreiros, com a
sua dança de espadas, embora esta arte esteja em vias de extinção.
Mas
agora vou contar uma história que acabei de ler, tendo como
protagonista principal o ferreiro Manuel Arriscado.
Vivia
no antigo Largo de S. Bartolomeu, hoje Av. Zeferino de Oliveira, e
quando alguém lhe pedia algo relacionado com a sua identidade, ele
respondia mais ou menos assim: Manuel Arriscado, bufão e malcriado,
morador na porta mais larga de S. Bartolomeu, em Penafiel.
Era
um homem muito bem disposto, tendo sempre uma graça para dizer, ou
uma anedota para contar e fazia-o em qualquer parte, perante um
auditório que o escutava com ansiedade, composto de pessoas que o
estimavam e que viam nele um espírito folgazão cheio de optimismo.
Claro
que o amigo Arriscado, não era bufão, nem malcriado, somente
procurando, dentro do seu espírito folgazão, gracejar com as
pessoas que o abordavam puxando a brasa para a sua sardinha como é
costume dizer-se.
Um
dos seus clientes que volta e meia acedia aos seus serviços era o
Dr. Carlos Santos juiz da Comarca de Penafiel.
Manuel
Arriscado fazia as reparações no seu carro de cavalos, que o mesmo
utilizava para se deslocar.
Sucedeu
que a determinada altura, o ferreiro Arriscado cometeu qualquer
transgressão, e teve que responder no Tribunal Judicial e, julgado
pelo referido juiz Costa Santos, acabando por ter que pagar uma multa
de certa importância.
Como
é natural, pagou como pôde, nada dizendo ao juiz que continuava a
passar à sua porta no carro puxado a cavalos, e a cumprimentá-lo
como sempre fazia:
-Adeus,
ó Manuel, como vai o negócio?
Ora
acontece que um dia o carro do Dr. Juiz Costa Santos. Avariou e o
Manuel Arriscado, ferreiro foi chamado para a necessária reparação
já que conhecia como ninguém o veículo de Sua Excelência que
ansiava pelo trem para seguir para sua casa.
Mestre
Arriscado trabalhou com afinco, e pronto o veículo, o Juiz
perguntou-lhe:
Manuel
Arriscado olhou de cima a baixo o Doutor Juiz, e sem pestaneja pediu
certa importância, à qual o Juiz ripostou:- Não
será caro, Manuel?
- - Desculpe, senhor Doutor, mas é para pagar a multa em que Vossa Excelência me condenou!
O
juiz riu-se e, bom homem como era, pagou e foi-se embora a comentar o
caso à sua maneira. Não há dúvida que o Manuel ferreiro resolveu
o seu problema do pagamento da multa, embora para o juiz não
passa-se de um oportunista.
O
Ferreiro, Manuel Arriscado, modesto como era a sua profissão, na
cidade todos o tinham por homem honrado e estimado, e por boa pessoa,
embora não fosse frequentador das igrejas, cuja memória resolvi
trazer ao blogue.
Hoje
já são em número reduzido os ferreiros existentes, que lá vão
dando a custo as suas marteladas, afiando a ferramenta, que já gasta
não consegue dar conta do recado.
No
entanto há ferramenta, que por mais tempera que se lhes dê, já não
se consegue afiar, limitando-se a ter direito a um espírito jovem,
quanto mais não seja para não perder a ideia de aguçar a mente.
É
a vida!
Fernando
Oliveira - Furriel de Junho
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