15 outubro 2018

O CRUCIFIXO NA ESCOLA

O CRUCIFIXO NA ESCOLA




Quando entrei para a escola primária Conde de Ferreira em Penafiel, no final dos anos cinquenta do século passado, na parede branca, sobre o quadro negro lá estava dependurado o crucifixo, ladeado pelos retratos de sua Excelência o Presidente da República e do Presidente do Conselho de Ministros.

Professora e colegas da 1.ª classe (1957)


Nesses tempos do Estado Novo, a religião adoptada pela Constituição de 1933, era a católica.

Mas com a entrada de António Carneiro Pacheco, para Ministro da Instrução Pública a 18 de Janeiro de 1936, vai-se realizar uma grande reforma no ensino.

Carneiro Pacheco


Uma das primeiras medidas foi alterar o nome do Ministério da Instrução Pública para Ministério da Educação Nacional.



Em nome da Nação, a Assembleia Nacional decreta e Carneiro Pacheco promulga a Lei n.º 1941, de 11 de Abril de 1936.




É a partir desta lei que é implementado o livro de leitura único em todo o país, que incentivasse à mentalidade nacionalista e cristã. A parte final de cada livro era dedicada à doutrina cristã.



Estes livros no final dos anos lectivos, não ficavam fora do prazo de validade, pelo que passavam de irmãos para irmãos ou irmãs, primos ou até de um filho de um amigo ou vizinho.

No meu tempo de escola primária os livros para as respectivas classes eram os seguintes:

Livro da 1.ª Classe

Livro da 2.ª Classe

Livro da 3.ª Classe


Livro da 4.ª classe

Quanto ao crucifixo, na Base XIII da lei nº 1941, podemos ler o seguinte:

"Em todas as escolas públicas do ensino primário infantil e elementar existirá, por detrás e acima da cadeira do professor, um crucifixo, como símbolo da educação cristã determinada pela Constituição".

O modelo de crucifixo oficialmente aprovado, foi concebido pelo génio do insigne estatuário Sr. Teixeira Lopes.

Na mesma determinação, Salazar, a fim de combater a falsificação dos crucifixos ou de impedir a livre concorrência, impõe que o crucifixo da catequização, de Salazar, teria de ser adquirido numa empresa muito recomendável, a União Gráfica (propriedade da Igreja católica).    

Podemos concluir, que a igreja de então não pregou prego nem estopa na operação crucifixo na sala de aula, mas com a sua venda, lucrou alguns escudos.

A bênção dos crucifixos era uma festa nas quais eram celebradas missas pelos párocos e até por bispos. Nesses festejos do regime, cantavam-se o hino nacional, hinos religiosos e patrióticos, e realizavam-se cortejos, levando o referido crucifixo à escola depois da realização da missa. Em geral, nesses eventos festivos, participava um membro da União Nacional. Estes factos tinham um valor simbólico, para além das festas propriamente ditas, com uma função ideológica traduzida na apologia do cristianismo e do catolicismo. 

 

Em Penafiel não foi diferente. No dia 1 de Dezembro de 1937, pelas 10 horas celebrou-se na Igreja Matriz uma missa presidida pelo padre de Penafiel Alcino Gonçalves de Azevedo.



No final da missa professores e alunos dirigiram-se para a Escola Conde de Ferreira onde ás 11 horas, foi hasteada a Bandeira Nacional, e teve lugar uma sessão solene.

Usaram da palavra os professores António Pais Neto, Director da Escola, Gaspar de Oliveira e o Reverendo Padre Alcino Gonçalves de Azevedo. 

Padre Alcino Gonçalves Azevedo
 

Presidiu a esta sessão, o ilustre Director do Colégio de Nossa Senhora do Carmo, sr. Padre Agostinho, secretariado pelos senhores Capitão Pinto, na qualidade de representante do Comandante Militar e o sr. major reformado Manuel Joaquim Camelo.



Segue-se o programa desta cerimónia:

1º – Abertura da Sessão Solene
2.º – Hino 1.º de Dezembro
3.º – Hino da Escola
4.º – Palestra sobre o 1.º de Dezembro
5.º – Sinos da Aldeia (orfeão)
6.º – Caravelas (orfeão)
7.º – Rapsódia (orfeão)
8.º – As Bandeiras (recitativo – canção)
9.º – Viva Portugal (recitativo)
10.º – As Campainhas (valsa)
11.º – Bênção dos Crucifixos pelo Padre Alcino Gonçalves Azevedo
12º – Crucifixo (recitativo)
13.º – Hino do Crucifixo (orfeão)
14.º – Palestras alusivas
15.º – Avé Maria (orfeão)
16.º – Padre-Nosso (recitativo)
17.º – Jesus (recitativo)
18.º – A senda do Calvário (recitativo)
19.º – Salmo (recitativo)
20.º – O Estudo (recitativo)
21.º – A Escola (recitativo)
22.º – Deus (recitativo)
23.º – Hino da Escola (orfeão)
24.º – A Portuguesa



No final desta emocionante cerimónia, em todas as salas de aula das escolas desta cidade de Penafiel, foi colocado um crucifixo.

Com o golpe militar do 25 de Abril de 1974, e com a nova Constituição laica de 1976, os crucifixos foram retirados das paredes das escolas. 

Como se isto não bastasse, crucificaram a língua de Camões, pondo as crianças a escreverem à moda do país de Jorge Amado.  


2 Comments:

Blogger Unknown said...

Obrigada. Foi com muita alegria que vi esta publicação.
Vivo em Setúbal, sou de Penafiel. Baptizada pelo Sr. Padre Alcino, na Igreja Matriz, no dia 14 de Setembro de 1951.
Maria do Carmo (Sonoro)

7:14 da tarde  
Blogger Fernando Oliveira said...

Ó Maria do Carmo, então também lês o blogue do teu amigo e colega de trabalho dos Serviços Municipalizados Fernando Oliveira. Um abração.

5:40 da tarde  

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