10 abril 2018

REGRESSO DA GUINÉ

REGRESSO DA GUINÉ
DA COMPANHIA DE ARTILHARIA 1486


No dia 3 de Setembro de 1967, Penafiel vestiu-se de gala, para receber os Militares da Companhia de Artilharia 1486, que regressava da Guiné, e de onde tinham partido há dois anos.


Com as tropas em parada no Campo Conde de Torres Novas, vulgarmente chamado de Campo da Feira, o Comandante do R.A.L. 5, sr. Coronel do C.E.M. António Manuel Carneiro Pacheco, deu as boas-vindas aos valorosos Militares da Companhia de Artilharia 1486 que em Janeiro passado conquistaram em terras portuguesas da Guiné, a Flámula de Honra “Grau Ouro”, iniciando deste modo o seu discurso:

Camaradas



Desejaria nesta hora ter o dom de orador como António Cândido, a Águia do nosso vizinho Marão, ou a inspiração do Poeta, qual António Nobre, cujo busto se ergue ao jardim fronteiro, para em breves, mas impressivas palavras dar as calorosas boas-vindas a vós, a valorosa companhia comandada pelo Capitão Dias Ferreira, que agora regressa da nossa portuguesíssima Guiné com o natural orgulho de ter cumprido com galhardia e distinção o seu dever.



Como Comandante do R.A.L. 5, o regimento de Penafiel, de onde há dois anos partistes de coração tenso pelo despontar da saudades das vossas mães ou esposas, noivas ou irmãs, mas de alma aberta já ao grande ideal de servir a integridade da Pátria na nossa província da Guiné, nessa África que é hoje o continente da esperança vos digo, sede bem-vindos. 

Quartel de Mansoa
 


Certamente que tivestes boas e más horas nessas paragens e gentes de Mansoa e Olossato, alvo de cobiça inimiga por serem nossas, pois desde há séculos falam a língua de Camões através, dos belos rios , as rendilhadas palmeiras e os areais desse como que Algarve de Além-Mar.

Olossato - Guiné



Sangue generoso de alguns ali ficou. Como preço glorioso do padrão que ajudaste a erguer assinalando aos presentes e vindouros que ali também é Portugal!



Em breve tereis ocasião de responder por eles “Presente”, quando citados forem os nomes de um branco e alguns auxiliares nativos da vossa companhia caídos no campo da honra, vossos queridos camaradas nesta gloriosa campanha de defesa da Pátria comum, Pluricontinental e Multirracial como bons portugueses, tombaram de pé, e estão presentes nesta hora com o mesmo aprumo com que empunhais vosso guião altivo e o precioso galardão que soubestes conquistar a flámula de honra, em ouro, com a qual enriqueceis as tradições desta velha unidade, “já pelo nome antigo tão famosa”.



Sede bem-vindos ao vosso quartel metropolitano, nesta altaneira cidade entre Douro e Minho, mais perto de entre Sousa e Tâmega, cujas tradições se radicam nos primórdios da nacionalidade e no exemplo de lealdade de Egas Moniz.



Sede bem-vindos, dizem os camaradas que em fileiras unidas vos recebem, contagiando-se ao vosso exemplo e aspirando a mesma honra e glória.

R.A.L. 5 - Penafiel



Eu vos saúdo em nome do R.A.L. 5!



Depois de cumprido o mais alto e caro dever para com a Pátria, com o legítimo orgulho de terdes sabido honrar a farda de soldado português, mostrando ao mundo que são de marca imorredoira as virtualidades da nossa raça, ides voltar aos vossos lares ao afecto de parentes e amigos que também ganharam jus à gratidão da Pátria pelo sacrifício da vossa ausência e o pesar da saudade ou da amargura.



Cumpriste bem a missão de soberania e civilização em longes terras portuguesas.



Se ali ganhastes honra em combate pela defesa do que é nosso, ajudareis agora a retaguarda, cada qual na sua terra a apoiar com o seu trabalho os que vos vão suceder para, com vista a ganhar-se a Paz, chegue finalmente o dia da vitória da razão de estarmos no mundo como Portugal Uno, de Aquém e Além-Mar.


Seguidamente usou da palavra o capitão Dias Ferreira em nome da Companhia que comandou, terminando por dizer:



“Foi uma honra comandar Homens como os que aqui estão presentes”.

Com as varandas das casas da cidade enfeitadas com colchas, o desfile com a fanfarra do R.A.L. 5 à frente percorreu as Avenidas Egas Moniz, Sacadura Cabral, Praça Municipal, Rua Serpa Pinto, Largo d' Ajuda, Rua Alfredo Pereira, Av. Zeferino de Oliveira até ao Sameiro, regressando pela Rua do Paço e novamente na Praça Municipal, em frente ao Monumento dos Mortos da Grande Guerra, as tropas em parada prestaram homenagem aos seus irmãos de armas que tombaram na luta da primeira Grande Mundial.


O capitão Dias Ferreira depôs um ramo de cravos no sopé do monumento e em continência todos os militares e o numeroso público assistente, onde se via o Sr. Presidente da Câmara, Coronel Fontes, que se fazia acompanhar dos vereadores srs. Fausto Pinto de Matos, professores Joaquim José Mendes e Rocha Nunes, Comandante da G.N.R., Sr. Tenente Ferraz, Subdelegado de saúde, Dr. Francisco Brandão Rodrigues dos Santos, e toda a oficialidade do R.A.L. 5 guardaram um minuto de silêncio.



Depois desta cerimónia as tropas dirigiram-se novamente para o quartel e, já na parada, foram sobrevoados por uma avioneta pilotada pelo Professor Luís Gonzaga Pereira de Azevedo, lançando flores sobre os soldados.



Mas o momento que mais fundo nos calou foi a entrega do Guião, enriquecido com a Flámula de Honra, feita pelo Comandante da Companhia capitão Dias Ferreira, ao Comandante do R.A.L. 5, Coronel Carneiro Pacheco.

As lágrimas bailaram nos olhos daqueles Homens que apesar de endurecidos na fornalha da luta ainda sentem vibrar na sua alma os significados maiores para o enriquecimento glorioso da nossa Pátria.

As cerimónias terminaram com um almoço colectivo servido nas magníficas dependências do quartel.
 
Brigadeiro Reimão Nogueira

A Flámula de Honra, Grau Ouro, foi atribuída à Companhia Artilharia 1486, devido aos sucessos operacionais levados a efeito no mês de Janeiro de 1967, na província da Guiné, sendo de destacar as operações Bloco, Alvorada, Estilha, Estarola, Elisa, Esquilo, Evereste e Electão, onde evidenciou qualidades de decisão, agressividade e bravura, atestados por brilhantes comportamentos em combate, causando numerosas baixas ao inimigo, bem como a captura de numeroso armamento, munições e documentos.

Material apreendido ao IN


Teve também especial relevo a acção psicológica que desenvolveu no Olossato na conquista das populações.

A 9 de Maio de 1967, foi efectuada uma cerimónia no quartel de Olossato, na Guiné, na qual sua excelência o Brigadeiro Comandante Militar, António Maria Malheiro Reimão Nogueira, impôs a fita respectiva no Guião da Companhia e entregou a flámula para ser hasteada.
 
A população de Olossato compareceu, tendo-se integrado na festa da Companhia.



A contrapor a toda esta pompa e circunstância da chegada das tropas do ultramar, vou contar a minha chegada a Lisboa num boeing 747, pilotado pelo tenente Lavrador, no dia 27 de Junho de 1975.

À nossa espera estava um cabo que nos dava uma guia de marcha para regressarmos de comboio às nossas terras, ao mesmo tempo que preenchíamos um papel para indicarmos para onde devia o exército enviar a nossa caderneta militar.

Compreendo perfeitamente toda esta diferença de tratamento, afinal o país andava entretido com a “Revolução”, e dentro de alguns meses acabava a cantilena do “Angola é nossa”. 

Será que os Camaradas penafidelenses mortos na Guerra Colonial, não mereciam um monumento próprio?
 
Se Camões já escrevia que “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, passados tantos anos a minha santa terrinha, ainda não viu que é uma falta de consideração para não dizer outra coisa, ter os mortos do ultramar numa placa no sopé do monumento aos Mortos da Grande Guerra.

Será que os Camaradas penafidelenses mortos na Guerra Colonial, não mereciam um monumento próprio, como fazem muitas cidades e vilas deste país? 

A guerra colonial terminou há mais de quatro décadas, mas em Portugal continuam a inaugurar-se monumentos de homenagem aos militares mortos e já rondam os 300.

in Diário de Notícias de 12 de Agosto de 2016 
 

Mas talvez seja defeito meu não acompanhar os tempos que correm, onde as lutas são travadas de faca e garfo, com mais ou menos medalhas ao peito.