01 março 2018

UMA SEITA MUSICAL

UMA SEITA MUSICAL

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Nos anos vinte do século passado, nasceu em Penafiel a “Seita dos Pelintras”.

Não sei a que propósito surgiu este nome já que alguns membros que cheguei a conhecer, nada tinham de pelintras, nem pertenciam a qualquer seita de malfeitores ou religiosa.

Embora o nome seja bizarro, o que é certo e sabido é que se tratava de um conjunto musical.

Este grupo possuía uma bandeira extravagante, encimada por um bacio de quarto (vulgarmente conhecido por penico), e dele fizeram parte:

  • João Pinto Matos
  • Boaventura Bessa
  • Joaquim Pinheiro
  • Tomaz da Rocha Quintas
  • Joaquim Ferreira
  • Luís da Rocha Quintas
  • Laurindo Nunes Pereira
  • José Guedes Taveira de Morais
  • Joaquim da Cunha Ferreira
  • António Ferraz de Menezes
  • José Vieira Novo
  • José Marques Babo
  • José M. Lopes de Carvalho
  • João Tavares da Silva

Neste época ainda não havia futebol na terra e estes jovens passavam o seu tempo a aprender música em diversos instrumentos, quantas vezes à luz da candeia, dado que a electricidade constituía um luxo para quem a utilizava.

Guitarras, bandolins, violas, cavaquinhos, bombos, ferrinhos, pandeiretas e demais instrumentos apropriados não faltavam neste típico conjunto de Penafiel que deliciava o público com o seu extenso reportório nas noites de S. João e S. Pedro entre outras.

Festa ou folguedo onde actuasse a Seita dos Pelintras já se sabia que era sinónimo de enchente.

Em tempos que já lá vão, na Rua Alfredo Pereira um festejo a S. João, promovido pelo comerciante Virgílio Queiroz, e tendo sido convidada a Seita dos Pelintras para ali actuar, isso foi o bastante para as outras cascatas da cidade ficarem ás moscas, a ponto de o organizador de uma delas ter ido pedir à direcção da Seita para o conjunto ir até lá, quando não as muitas prendas que tinham no bazar acabariam por não ser leiloadas por falta de compradores.

Mas enganem-se os que pensam que esta Seita dos Pelintras, era apenas para consumo caseiro.

No dia 8 de Julho de 1923, a Seita dos Pelintras deslocou-se à Vila de Amarante (hoje cidade), tendo introduzido no seu reportório duas novas canções as quais passo a transcrever as letras das mesma: 

 
Saudação a Amarante

Oh! nobre e linda Amarante
De tão velhas tradições
Ouve o brado anti-sonante
Destes ternos corações!

Ouve, princesa do rio,
Que de prata é todo feito,
O coro dum rapazio
Que por ti tem muito respeito.

Ouve, sim, os nossos hinos
Cheios de amor e beleza
E com teus gestos divinos
Junta-nos na mesma mesa

Um laço bendito e santo
De fraternal amizade
Apregoa o nosso canto
Que não tem outra vaidade

Oh! bela e linda Amarante
Nós, os filhos de Arrifana
Neste dia delirante
Por ti bradamos; Hossana!


Ás Damas Amarantinas

Oh! ninfas amarantinas
Donzelas, cândidas, puras,
Que nas águas cristalinas
Afogais mil amarguras.

Aceitai as saudações
Desta alegre mocidade
Que vos traz nos corações
Muita e sincera amizade

Recolhei nos vossos peitos,
Quais filhos em doces lares,
Nossos carinhos só feitos
Dos vossos ternos olhares

E após a nossa partida,
Que de vós connosco vá,
Uma saudade nascida
Da nossa vinda por cá.

E nos vossos corações,
Nunca deixeis de pedir,
Que Deus dê muitos galões
De galinhas a fugir.

Que o vosso rio, ao passá-lo,
Nos não leve um só Pelintra,
E que o vosso S. Gonçalo,
Vos case em antes dos trinta.

E assim ficamos a conhecer a Seita dos Pelintras, que por cá andou antes de nós a alegrar as noites de farra com as suas músicas, e talvez muitos musicólogos cá da terra desconheçam.