HOMENAGEM AO DR. JOAQUIM COTTA
HOMENAGEM
AO
DR. JOAQUIM COTTA
Joaquim
de Araújo Cotta, nasceu na cidade de Penafiel a 4 de Abril de 1873,
e faleceu a 12 de Setembro de 1957.
O
Dr. Joaquim Cotta, desempenhou vários cargos, de entre os quais
destacamos:
- Director da Escola Primária Superior do Porto, criando o curso nocturno em Penafiel.
- Director da Casa Hospício, que funcionou na Av. Egas Moniz, então Rua Formosa.
- Médico e Director Clínico do Hospital da Misericórdia de Penafiel (1929 – 1952)
- Presidente da Câmara de Penafiel (1919)
- Leccionou no Colégio do Carmo em Penafiel (1921 - 1926)
- Governador Civil do Porto
Sábado,
19 de Outubro de 1974, o Salão Nobre da Câmara Municipal de
Penafiel, abriu-se de par em par para receber os Srs. Dr. Mário Cal
Brandão, Governador Civil do Distrito do Porto, o Professor Ruy Luís
Gomes, Reitor da Universidade do Porto, que se faziam acompanhar de
suas esposas, e outras individualidades, figuras destacadas da vida
concelhia, médicos, advogados, clero, e o povo anónimo que também
marcou presença.
Os
senhores Dr. Armando Cotta, seu irmão José Cotta, seus familiares,
famílias ligadas ao homenageado, ou das suas relações, entre as
quais podemos referir: Cesário Bonito, pessoa que serviu como
secretário do dr. Joaquim Cotta, quando Governador Civil do Porto,
Engenheiro António Resende, Dr. João Resende, Eng.º
Teixeira Pinto, António Maximiano Silva, Dr. Júlio Semedo e esposa,
António Guedes e família, Drs. Abílio e Antero Moreira, Eng.º
Bazílio Jorge e esposa, D. Maria Adelina Costa, Eng.º Manuel Babo,
Dr. João Pinto Ferreira, José Menezes (Cabanelas), Dr. Henrique de
Almeida, eo Sr. Manuel Mota de Lousada.
A
mesa que se formou na Câmara era constituída pelas seguintes
individualidades: Dr. Cal Brandão, Governador Civil do Porto, que
presidiu e que tinha à sua direita o Professor Ruy Luis Gomes, Dr.
Luís Guedes, e o Presidente da Comissão Administrativa da Câmara
Municipal de Penafiel , Dr. Guy Falcão, e à sua esquerda a senhora
D. Constança Cotta, filha do homenageado, Pároco da cidade Padre
Albano Ferreira de Almeida, Dr. Rodrigues dos Santos.
Guy Falcão - Foto cedida por Beça Moreira |
Dr.
Guy Falcão foi o primeiro orador e deu as boas vindas aos ilustres
visitantes:
Minhas
Senhoras
Meus
Senhores
A
vinda cá do Senhor Governador Civil e do Senhor Reitor da
Universidade do Porto, é motivada por um acto de justiça que a
cidade e concelho de Penafiel vão prestar dentro em breve a um dos
seus filhos mais ilustres.
Antes
de se efectivar esse acto de justiça, nós, Comissão Administrativa
da Câmara Municipal de Penafiel, quisemos receber na sala de visitas
da cidade que é este Salão Nobre, as individualidades que nos
visitam hoje pela primeira vez.
Este
dia será um dia importante para a história da cidade e do concelho
terão tido a oportunidade de receber tão ilustres visitantes como
aqueles que estão agora aqui perante nós: o sr. Dr. Cal Brandão e
o sr. Professor Ruy Luís Gomes. Portanto, para nós este dia será
realmente um dia histórico dado que para além de termos de prestar,
com inteira justiça, um acto que de há muito já Penafiel deveria
ter prestado que, a homenagem ao Dr. Joaquim Cotta, para além desse
acto, temos também a oportunidade muito rara, na história do
concelho, de albergar pessoas distintas do ponto de vista técnico,
do ponto de vista científico e sobretudo, do ponto de vista humano,
do ponto de vista democrático.
Portanto,
Penafiel deve ter orgulho hoje por duas posições históricas que a
cidade vive: um acto de justiça e o poder albergar personalidades da
estirpe das que hoje honraram a cidade e o concelho.
Em
nome da cidade e do concelho de Penafiel, em nome da Comissão
Administrativa , suponho que interpretando os sentimentos de 50.000
mil habitantes deste concelho, eu quero agradecer a Vossas
Excelências a vinda cá, e podem ter a certeza de que Penafiel
saberá interpretar, estou convencido disso, tudo aquilo que o 25 de
Abril veio proporcionar de alegria, de democracia de bem estar para o
povo português.
Muito
e muito obrigado.
Cal Brandão |
Seguidamente tomou a palavra o
Dr. Cal Brandão, Governador Civil do Porto.
Senhor
Reitor da Universidade
Senhor
Presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal
Senhor
abade de Penafiel
Minhas
senhoras e meus senhores
Não
podia de modo algum deixar de estar presente a esta homenagem que se
presta a um Governador Civil do Porto, da Primeira República, não
podia, como disse, deixar de estar presente o primeiro Governador
Civil da segunda República, deste mesmo distrito.
É
um acto de justiça, mas além de ser um acto de justiça prestado ao
antigo Governador Civil da primeira República, é um acto de justiça
prestado ao cidadão íntegro, ao homem digno que foi o Sr. Dr.
Joaquim Cotta.
Além
das qualidades morais que melhor do que eu V. excelências todos
conhecem, eu tenho que ressaltar as qualidades do democrata ilustre
que foi e de resistência à tirania e ao fascismo que dominou o
nosso país durante quarenta e oito anos.
Conheci
o sr. Dr. Joaquim Cotta nesta cidade. Suponho que foi mesmo a
primeira vez que vim a Penafiel, e vim aqui numa das diligências
que fazíamos na luta contra o fascismo.
Acolheu-nos
ali na sua casa e passou a colher-nos mais vezes, sempre que
necessitávamos da sua atitude perante a ditadura, ele estava sempre
disposto a oferecer-se para este combate. E sempre que era precisa a
sua assinatura para juntar a outras, com o risco que naqueles
momentos todos corríamos, nunca o sr. Dr. Joaquim Cotta deixava de
ser dos primeiros a assinar os documentos que se tornavam necessários
apresentar ás autoridades então vigentes.
Recordo-me
portanto muito, bem disso, e é para mim muita honra coincidir a
minha primeira visita a este concelho, como referiu o Presidente da
Comissão Administrativa, cujos cumprimentos eu lhe agradeço, com a
justíssima homenagem que todos nós estamos a prestar à memória do
sr. Dr. Joaquim Cotta.
Eram
estas breves palavras que eu tinha a dizer.
Para
o leitor compreender melhor a carta que se segue, acontece que tendo
Sidónio Pais tomado o poder em Dezembro de 1917, através de um
insurreição armada e destituindo o governo de Afonso Costa, muitos
democratas portugueses foram presos e deportados, entre os quais
Joaquim Cotta.
De
seguida Cal Brandão pediu licença para ler uma carta dirigida ao
sr. Dr. Armando Cotta filho do homenageado pelo amigo Artur Santos Silva, e que refere um
episódio das lutas políticas e nas quais interveio o Dr. Joaquim
Cotta e de que ele, Dr. Artur Santos Silva, foi testemunha e que por
ser um documento de interesse, eu pedi ao Dr. Armando Cotta para ler
a Vossas Excelências e, segundo era, a vontade também do próprio
signatário.
Meu
caro Armando
Estou
a braços com as maleitas de uma gripe que me arrastaram já três
vezes para a cama. Os 64 anos vão-me pesando e agora dizem-me que
preciso de ter redobrados cuidados com estas gripes que dantes se
curavam a pé.
Escrevo-te
por ter conhecimento pelo Andrade, que amanhã vão prestar uma
homenagem ao teu ilustre pai, esse velho cidadão que conheci nos
anos trinta numa prisão de Lisboa, cuido que o Aljube, para onde
fora também enviado meu pai.
Esses
encarceramentos, segundo os governantes, faziam-se em nome do bem
comum.
Recordo
que sem qualquer processo, os democratas eram enviados para terras
distantes, em barcos, com cartas de prego. Os familiares dos presos
não eram avisados do dia da partida e no cais de Alcântara, nos
juntávamos todos, quando sabíamos que partiam barcos para as
colónias e para as ilhas, para saber quais os que partiam, e lhes
dizer o nosso adeus.
Recordo-me
que um dia, que com minha mãe, fui visitar meu pai e soubemos que o
seu Dr. Joaquim Cotta, tinha inesperadamente seguido com a leva de
presos desse dia, só com a roupa que levava no corpo.
Como
soubéssemos que a lavadeira da prisão tinha no momento que lá
chegamos, algumas peças de roupa que teu pai mandara lavar, partimos
para o cais de Alcântara, imediatamente, para ver se chegávamos a
tempo de lhe as entregar.
Aconteceu
que, precisamente, no momento em que o barco se deslocava do cais,
chegamos nós. Olhamos para o teu pai que estava na amurada do navio,
desanimado. Por não poder cumprir a nossa missão, manifestamos o
nosso desgosto.
É
então que um marujo que está junto de nós, pegou na trouxa da
roupa e a lançou com uma perícia invulgar para o local em que o teu
pai se encontrava.
Minha
mãe, que conheces-te, era uma pessoa de temperamento bravo, e ficou
revoltada. Resolveu ir comigo ao Ministério do Interior protestar.
Deparou-se-lhe
um oficial, do exército cheio de medalhas, sentado num cadeirão, a
quem expôs o caso, declarando-lhe que não era razoável que os
presos políticos partissem para terras distantes sem as famílias
serem previamente advertidas.
Teu
pai, penso que não teve qualquer familiar a despedir-se dele.
O
homem era o coronel Pestana Lopes, criatura mal educada e tratou
desrespeitosamente, com ar despropositadamente enfurecido.
De
repente, deu a entender à minha mãe, com presteza, que a
conferência acabara.
Esta
muito friamente, virou-se para o espantalho e disse-lhe:
“Já
sei, pela maneira como trata uma mulher, que ganhou essas medalhas
todas pelas secretarias”.
De
seguida, pegou-me na mão, eu era um rapazito, virou as costas ao
marmanjo e saiu.
Ainda
olhei para a cara do herói e vi que ficou com a cara
vermelho-negra, apoplético, mas não fez nada.
Era
interessante contar esta história na homenagem a teu pai para que
esta gente de hoje saiba quanto era a intolerância e a impiedade
naquele tempo.
Teu
pai combateu até ao fim sem temor das brutalidades dos governantes,
arriscando tudo pelos seus ideais.
Foi
um homem político, sem mácula e sem mancha que deixou atrás de si
o exemplo de uma conduta própria de um carácter de eleição.
Tive
muita alegria em saber que Penafiel homenageará como deve um dos
seus filhos muitos ilustres.
Um
abraço a teu irmão e para ti do velho amigo
Artur
Santos Silva
Acabada
que foi descrita a cerimónia da homenagem prestada no Salão Nobre
da Câmara Municipal de Penafiel, na próxima semana falaremos da
inauguração das placas da rua com o seu nome e da romagem ao
cemitério de Penafiel.
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