25 e 3 OS NÚMEROS MÁGICOS NO REINADO DO POUCOCHINHO
25
e 3
OS NÚMEROS MÁGICOS
NO
REINADO
DO
POUCOCHINHO
Lá
em casa, a patroa resolveu sem mais nem menos mudar de quarto, sem
que eu lhe tenha feito algo de mal.
Ao
acordar já não dá-mos o beijo matinal e sempre que me tento
aproximar dela lá vem a ordem de manter distância.
Quando
vamos descer a escadaria, enquanto um desce, o outro espera que ele
termine para iniciar a sua descida fazendo lembrar um elevador no
nosso imaginário.
Na
mesa foi aumentada a distância entre os pratos, e quando alguém diz
alguma coisa, como chega cá a travessa ou a garrafa do vinho, todos
viram a cara para o lado contrário de onde sai a voz.
Agora
mesmo recebi ordens que devido à minha idade e por ser um doente de
alto risco, tenho que ficar confinado o dia todo à superfície da
casa. E chamam eles a isto ficar de quarentena, mas parece-me muito
pior que uma prisão domiciliária.
Da
janela que dá para a rua vejo algumas pessoas a fazerem fila com
certa distância umas das outras, e é engraçado aquele jogo de pés,
que quando uma se aproxima a outra recua como se fosse uma dança de
algum ballet mal ensaiado. Este bailado é visível na porta da
farmácia, na padaria, no pomar, na mercearia, e nos grandes centros
comerciais aumenta e muito o número de bailarinos.
Sinto-me
prisioneiro dentro da minha própria casa transformada em cela, a
aguardar a hora do recreio para desentorpecer as pernas.
Essa
hora passou para horário nocturno e com a condição de ter que
levar o cão comigo. O animal parece que adivinha que vamos sair e
faz-me uma festa dos diabos, mas até esta passeata tem pré-condições
estabelecidas.
Só
podemos ir a “duas igrejas”, ou melhor dizendo dar a volta ao
quarteirão. Como se isto não bastasse, numa cidade deserta de
almas, tenho que ir no meio da rua. Pois as instruções são
rígidas, e quando aparecer alguma alma perdida, devo desviar-me mais
o cão para o lado oposto ao da direcção que ela caminha.
Cruzamos
e nada dizemos nem sequer olhamos um para o outro. A minha vizinha
que nos vê da sua janela e dantes cumprimentava e sorria, agora
apenas acena com o braço de longe ao que eu correspondo do mesmo
modo.
E
lá vou dando umas voltas ao bilhar grande com o cão, que também já
não ladra apenas fala comigo com os olhos mostrando a sua satisfação
na sua linguagem gestual, abanando o rabo. Até ele anda triste com a
quarentena.
A
televisão está intragável. Quando fala o Primeiro Ministro ou
outro/a ministro/a do governo, vem logo de seguida os comentadores
cartilheiros dos outros partidos afirmarem a pé junto que por mais
cara séria que eles ponham, vê-se logo que estão a mentir.
Depois
é só desgraças com x doentes corovirais, y mortos e z recuperados.
Estes recuperados são os que se lesionaram e agora estão aptos a
irem de novo a jogo. Até estes números segundo dizem não andam a
bater certo.
Por
isso, quando quero saber como vão as coisas na aritmética da
pandemia, recorro ao meu amigo do facebook que vai actualizando em
tempo real o resultado deste jogo entre a vida e a morte.
Dizem
que a economia vai ficar muito doente, embora não seja para todos,
mas está assegurada que são os mesmos a suportar o custo de trazer
de novo o país à vida real.
Com
a diarreia do medo a instalar-se nas pessoas, a fábrica do papel
higiénico não tem mãos a medir, assim como a indústria do
material de protecção para médicos e enfermeiros não dá vazão
ás encomendas.
Nesta
guerra, os generais e os soldados que nos defendem, não estão
aquartelado em quartéis, mas em hospitais, Postos Médicos, camiões
que transportam géneros alimentares, lixo ou vêm com desinfetante
lixíviado, dar banho ás ruas da cidade, padarias, farmácias e
muitos outros lugares.
Estes
capitães sem rostos chamados de médicos, enfermeiros, camionistas,
pessoal da limpeza, padeiros, farmacêuticos, etc., todos eles nas
suas trincheiras lutam para concertar o país.
E
eu, e tu e nós também entramos neste jogo? Claro que sim!...Só que
desta vez no banco dos suplentes, ora batendo palmas para apoiar e
animar os que estão em jogo, ora estando em casa a torcer para a
vitória da nossa equipa contra a do coronavírus.
Mas
a partir de hoje vou dormir mais descansado.
As
Cortes do Reino reuniram desta vez sem a presença do povo, mas e
apenas com a massa cinzenta do povoado e deram à luz 25 medidas
para salvar os pobres dos pobres, ao mesmo tempo que o Santuário de
Fátima oferecia 3 ventiladores condizente com esse número mágico
referente aos Pastorinhos e aos Segredos de Fátima, para ajudarem a
salvar 3 almas de cada vez que são utilizados.
Por
isso vou festejar a implementação destas medidas, como não podia
deixar de ser, tal é a alegria que me invadiu o coração e a alma.
As
25 medidas serão celebradas com 25 copos de Licor Beirão, o melhor
de Portugal, a condizer com o nosso monarca, enquanto os 3
ventiladores oferecidos pelo Santuário de Fátima, como dizem
respeito a coisas do além, não me sinto com competência para
arranjar modo de festejar.
Os
maldizentes do reino, mais conhecidos pelos bota abaixo, vieram logo
à praça dizer que tudo isto era muito pouco, mas parece-me que esta
gente ainda não compreendeu, que vivemos no reinado do poucochinho.
Fernando
Oliveira – Furriel de Junho
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