O RIO CAVALUM
O
RIO CAVALUM
“Nunca
ninguém pensou no que há para além, do rio da minha aldeia”
Fernando
Pessoa.
O rio da minha aldeia
chama-se Cavalum. O Rio Cavalum, nasce, corre e morre no concelho de Penafiel.
Se actualmente tem a
sina de muitos outros rios deste país, ou seja, o seu leito transformado num
caudal de esgotos, dizimando a sua fauna e flora, nem sempre foi assim.
A história que aqui vou
contar, passou-se há muito tempo, naquele tempo em que ainda as crianças se
podiam banhar nas águas límpidas do Cavalum, e os peixes eram visíveis a olho
nu a deslizarem nas águas.
Na sua margem direita
na freguesia de Milhundos (hoje anexada à freguesia de Penafiel), existia uma
grande quinta com o nome de Quinta das Lages, cujo dono era o Barão com o mesmo
nome.
Acontece que nesta
freguesia morava um engenheiro de seu nome Luís Madureira.
Certo dia começou a
magicar que o rio apesar de ter pouco caudal de água, havia de produzir energia
eléctrica. Isto claro numa altura em que a electricidade não tinha chegado ao
concelho de Penafiel.
Se ideias não lhe
faltavam, dinheiro para as por em prática é que nem vê-lo.
Foi então que certo
dia, resolveu esperar no portão da Quinta das Lages a saída do Barão.
- Senhor Barão!... Gostava
que me desse dois minutos de atenção.
- Agora não, que estou
atrasado, mas amanhã apareça pelas três horas da tarde.
Assim, no dia seguinte
lá estava o engenheiro Luís Madureira com um braçado de papéis à hora
combinada. Entraram para a morada da quinta em forma de castelo, e lá falaram
demoradamente, sobre a possibilidade de tanto a moradia como até a própria
quinta ter iluminação.
O Barão ficou de tal
maneira entusiasmado pela ideia, que no dia seguinte já estava a pedir
orçamentos para tal execução.
Sô Jaquim que era o
feitor da quinta, falava disto a toda a gente na tasca do Bebe Zé. A notícia
espalhou-se por toda a freguesia e concelho, embora fossem mais os incrédulos
que os que acreditavam.
Aproveitando o declive
da quinta e a força da gravidade, fez um caleiro que levava a água do rio para
um poço, construído na casa dos motores. Este reservatório em forma de poço quadrangular,
tinha um volante na parte inferior, que aumentava ou diminuía a pressão da água
à sua saída, que por sua vez movimentava um dínamo, cuja corrente gerada, era
armazenada em baterias.
Mal a noite caía uma
rede de lâmpadas espalhadas pela quinta acendiam, iluminando o caminho desde a
casa até ao portão de entrada da quinta.
Sô Jaquim, recebia
instruções sobre electricidade do Engenheiro Luís, e por isso creio que foi o
primeiro electricista feito à pressão (pois nessa altura ainda não existiam
Novas Oportunidades) cá do sítio.
Mal a obra foi
concluída, Sô Jaquim entrava de papo feito, na tasca do Bebe Zé, a mostrar os
seus conhecimentos sobre o funcionamento de todos aqueles mecanismos.
- Eu não vos dizia, que
o Rio Cavalum ia produzir electricidade?
- O Engenheiro
Madureira é uma categoria.
Se os trabalhadores da
quinta andavam maravilhados, diariamente pelas dezanove horas, muitas pessoas
que viviam nas redondezas aguardavam o acender das lâmpadas, para depois irem
contar para casa, ou falar na tasca do Bebe Zé do que tinham visto.
No entanto, quem havia
de dizer, que este melhoramento, haveria de custar a vida do Barão das Lages.
Certo dia de Verão, em
que o calor transforma o nosso corpo num corrupio de suor, o Barão resolveu ir
todo suado até às estopinhas, descansar na casa das máquinas expondo-se a uma
corrente de ar que lhe originou uma pneumonia que o levou desta para melhor.
Os trabalhadores da
quinta, quando souberam da notícia, tiveram ganas de partir toda aquela
aparelhagem, responsabilizando-a pela morte do patrão, mas tal tarefa estava
entregue ao progresso que mais tarde se instalou, tornando toda esta
aparelhagem obsoleta e o Rio Cavalum fora dos mapas dos rios produtores de
energia eléctrica, restando apenas na casa das máquinas o quadro em mármore, o
poço em pedra e os mosaicos com os nomes dos físicos colados nas paredes.
E depois de tudo isto,
você ainda se lembra do nome do rio que passa na minha terra?
1 Comments:
Parece-me que se justificava gastar algum dinheiro do muito desperdiçado por aí, para repor o mais possível essa "geringonça".Trata-se de algo com muito valor histórico.
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