15 abril 2014

ESTA GENTE EXISTIU



ESTA GENTE EXISTIU

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Através do telejornal, fiquei a saber que muitas cantinas escolares vão continuar a laborar nestas férias da Páscoa, para servirem refeições a alunos que de outra maneira estavam condenados a passarem a Páscoa com fome.

Se esta situação não é nova no país, pois já no tempo da Guerra Civil de Espanha (1936-1939), enquanto se enviavam as sobras de Portugal para as tropas de Franco, graças à solidariedade e boa vontade de certas pessoas o caso da fome nas escolas se ia resolvendo. 

Escola da Bustelo. Foto cedida por Reinaldo Meireles

Estou-me a lembrar do benemérito Manuel da Rocha Melo, que às suas custas financiou a construção e o funcionamento das cantinas de Novelas e Bustelo, assegurando refeições gratuitas aos alunos que delas necessitavam nestas freguesias do concelho de Penafiel. 

À Cantina de Novelas deu-lhe o nome de sua esposa América Cardeal da Rocha Melo e à de Bustelo baptizou-a com o nome da sua filha Maria do Carmo da Rocha Melo.

Ao desfolhar o jornal “O Tempo de 1938”, encontrei dois acrósticos assinados por um tal CABANAS, que retrata desta forma literária a solidariedade desta família, para com os seus conterrâneos.

O primeiro dedicado a América Cardeal da Rocha Melo, e o segundo a Maria do Carmo da Rocha Melo e rezam assim:

Escola de Novelas. Foto cedida por Reinaldo Meireles

Alma santa nos ensina
Mestra em filantropia
Em escola e em cantina,
Real, bondade e valia.

Ilustrando-se as crianças,
Com a luz que forma estrelas,
Acendem-se as esperanças,
Com o bem que tem Novelas.

Assim já iluminassem
Ricas luzes de instrução
De toda a parte irradiassem
Estes bens do coração.

A grandeza que encerra
Lá ao mais alto ascendendo
Desta acção da vossa terra
Anda Deus agradecendo.

Risonhos anjos, lá há,
Ofertam ventura imensa,
Carinhos, risos, e, já,
Há no céu a recompensa
A tal Mãe deles, de cá.

Minha pena assim pudesse
Erguer-vos um monumento
Literário, sucedesse
O ter eu maior talento.

CABANAS

Escola de Bustelo. Foto cedida por Reinaldo Meireles


Mãe dos pobres de Bustelo
Alma isenta de egoísmo
Ruma neste bem mais belo
Incensada de humanismo

Aqui vos presto o meu preito,
Dedicado a vosso zelo,
Orientado pelo feito
Conferido ao Bustelo

A escola e a cantina
Revela-se assim já tanto,
Maria, qual Mãe divina,
O teu nome será santo.

De ventura cobrirá
As tuas acções tão nobres,
Rei dos Céus, Deus, te dará
O lugar da Mãe dos pobres

Clarim de mores talentos,
Havia de ser, Senhora,
A chamar, aos avarentos,
Egoístas d’esta hora.

Mas ao culto da bondade,
Eu, embora sem talento,
Lembrarei à humanidade
O vosso merecimento.

CABANAS

Dizem-me que gente desta categoria já não existe, o que até pode ser verdade, mas antes que os apagadores da história actuem, aqui fica um registo para que os vindouros saibam, que esta gente existiu, e nem precisam de um busto, nem de serem medalhados para serem lembrados, respeitados e acarinhados, já que as suas obras falam mais alto.