06 agosto 2020

O INÍCIO DO TEMPO DO ANGOLA É NOSSA

O INÍCIO DO TEMPO

DO ANGOLA É NOSSA



O esperado Estatuto do Antigo Combatente, aprovado na Assembleia da República, abrange não só os combatentes da Guerra Colonial, mas também todos aqueles que ainda hoje participam em Missões de Paz no estrangeiro.

Tanto o governo do antigo regime como os que se lhe seguiram depois de Abril, desprezaram os ex-combatentes que passaram pelos teatros de guerra na Índia, Angola, Guiné, Moçambique e Timor.

Para estes senhores os ex-combatentes das antigas colónias, são iguais aos que vão voluntariamente e bem pagos para países que nem sequer falam a língua de Camões.

Nesse estatuto, foi escolhido o dia 9 de Abril como o Dia do Antigo Combatente, quando deveria ser na minha opinião o 10 de Junho que abrange toda a Nação e não somente um dia de uma batalha, desprezando todas as outras como por exemplo Aljubarrota, que para Portugal foi muito mais importante que La Lys.


Embora o colonialismo, ainda seja um tema tabu na nossa sociedade, hoje vou falar do dia em que a Guerra Colonial se iniciou, e onde um penafidelense resistiu no meio dessa contenda, na cidade de Luanda no dia 4 de Fevereiro de 1961.

Esta data do 4 de Fevereiro, não foi escolhida ao acaso, para o início da luta armada pela independência de Angola.

Luanda estava cheia de jornalistas de todo o mundo, devido ao assalto a 22 de Janeiro de 1961, do paquete Santa Maria pelo comando organizado por Henrique Galvão.


Acontece que corria o boato que o mesmo ia atracar em Luanda, o que fez deslocar jornalistas de todo o mundo à capital angolana.


Quando ficou claro que o navio não viria para Luanda, mas seguia rumo ao Brasil, os jornalistas começaram-se a preparar para abandonar a capital angolana, e é neste contexto que se dá a rebelião do 4 de Fevereiro com a finalidade de estes acontecimentos terem grande projecção mediática internacional, aproveitando a presença da imprensa e da rádio nacional e estrangeira em Luanda, pois isso convinha aos nacionalistas angolanos, na altura tratados por Portugal de terroristas.

O paquete Santa Maria, foi entregue às autoridades portuguesas no Brasil no dia seguinte destes acontecimentos, ou seja, a 5 de Fevereiro de 1961, e chegou ao cais de Alcântara em Lisboa, no dia 16 de Fevereiro de 1961, e Salazar fez questão de ir pessoalmente receber o navio, onde agradeceu à multidão que aguardava no cais, com a célebre frase:


A queda do Império Colonial Português, começa com a invasão de Goa, Damão e Diu pela União Indiana, a 17 de Dezembro de 1961, quando era Presidente do Conselho de Ministros Dr. Oliveira Salazar, e a 19 de Dezembro de 1961, ou seja, dois dias depois, é consumada a anexação destes territórios na União Indiana.


Este aparte apenas serve para termos a noção que no ano de 1961, o quanto o regime português foi abalado.


Se por um lado, o 4 de Fevereiro, teve o efeito de uma operação surpresa, por outro a sua organização não estava o suficiente madura para ter o êxito total esperado, mas foi o quanto bastou para ter destaque a nível mundial esta acção de revolta anti-colonial dado pela imprensa estrangeira, como pretendiam os seus autores.


É com estes episódios que se vai dar início à Guerra Colonial, e ao tempo do Angola é Nossa.


A ordem e a tranquilidade que se vivia em Luanda, não aconselhava rigorosa vigilância policial, quanto mais não fosse para não cansar os guardas sem necessidade.


Assim, quatro grupos de sessenta homens cada, compostos por brancos e negros angolanos, armados de armas automáticas e catanas, aproveitando a calada da noite de 4 de Fevereiro de 1961, entre as 2h 20m e 2h 30m, quando a população dormia na paz do Senhor, assaltaram cheios de ferocidade:


1 – A Cadeia da PIDE, no Bairro de S. Paulo, com a finalidade de libertarem presos políticos, mas não conseguiram os seus objectivos.


2 - Cadeia da 7.ª Esquadra da PSP, situada na estrada de Catete onde havia também presos políticos, matando um guarda e ferindo um cipaio.

Nesta esquadra existia um depósito de armas e estavam detidos presos à ordem da PIDE.

Alguns participantes neste ataque, são identificados como sendo da UPA, designadamente o escriturário Augusto António Lemos, o empregado Eduardo Sebastião da Silva, o operário João Nunes de Carvalho e o enfermeiro Pedro António Inácio. Recebidos a tiro, os atacantes tiveram 14 mortos.

Na Esquadra estava o chefe e um pelotão. Mas o armamento estava na arrecadação. E quando tocou o alarme, o pessoal correu todo para a arrecadação, para trazer o armamento. Quando os atacantes entraram na Esquadra, já o alarme estava a tocar. De modo que os guardas começaram a alvejá-los. E com os tiros, os atacantes fugiram.


3 – No assalto ao Quartel da Companhia Móvel de Polícia de Segurança, ficaram gravemente feridos o Chefe Manuel das Neves, o Sub-chefe Manuel Vieira Pinto e três guardas.

Um desses grupos montou uma emboscada a uma patrulha da Polícia Militar, neutralizando os quatro soldados, tomando-lhes as armas e as munições, tentando, depois, libertar os presos políticos, num ataque frustrado à Casa da Reclusão Militar.


4 – Casa da Reclusão Militar, com o objectivo de libertar todos os presos políticos que lá se encontravam, o que não conseguiram, causando a morte de um 1.º cabo.


5 – Emissora Oficial de Angola, sendo morto um guarda e ficando gravemente ferido o nosso conterrâneo, Cândido Barbosa dos Reis Sales, natural da freguesia de S. Tiago de Sub-Arrifana, Concelho de Penafiel, que viria após tratamento a recuperar dos mesmos.

Em defesa da Emissora de Angola juntamente com os seus camaradas de armas, se destacou com a sua bravura, este penafidelense de nome Cândido Barbosa dos Reis Sales, para evitar que este grupo armado semeasse o terror, a desordem e a morte na população de Luanda.


6 - O grupo destacado para o Aeroporto, onde devia incendiar os aviões estacionados na pista, não terá realizado a operação, porque os participantes, ao ouvirem tiros, puseram-se em fuga.


Nestas acções, morreram quarenta guerrilheiros, seis agentes da polícia e um cabo do Exército Português, junto da Casa da Reclusão.

Nesses tempos do Angola é Nossa, são enviados muitos jovens para a guerra, não havendo família que não tenha um membro tomando parte da mesma, até ao dia de S. Martinho de 1975, em que as ex- colónias africanas, dão lugar a países independentes.

Como em todas as guerras, houveram os que tombaram, os que vieram estropiados, os que trouxeram doenças que arrastam até ao fim da vida, mas todos vieram diferentes.

Na Santa Terrinha, amorfa como convém, aos filhos da terra que tombaram pela Pátria, resolveu que os mesmos deviam continuar tombados numa lápide, colocada por quem nunca combateu, nem faz ideia o que isso é.



Se no antigamente se terminavam os textos com o “A BEM DA NAÇÃO”, hoje vou terminar com um “A BEM DA DIGNIDADE”, arranjem outra solução mais digna, porque quem deu a vida pela Pátria, merece muito mais respeito.


Fernando Oliveira – Furriel de Junho