01 dezembro 2022

A FOME

A FOME

 


Há dias vi o maior turista português, que habita num palácio para os lados de Belém, na capital da fome, muito preocupado com os famintos que por aí andam, ao ponto, vejam bem, de roubarem latas de atum nos supermercados, esses mesmos que ganham rios de dinheiro com essa desgraça nacional, que o diga o facturamento no dia em que o Banco Alimentar se instala ás portas dos mesmos.

 


 

Portugal sempre foi um país de um povo pobre, tanto de espírito como do vil metal, vivendo de mão estendida da pedincha nacional como na internacional como é o caso dos subsídios da UE.

 


 

Acreditei que com o 25 de Abril iríamos eliminar a pobreza do antigamente, mas não, apenas mudamos alguns rótulos para aliviar consciências e nada mais.

Se dantes tínhamos a sopa dos pobres, hoje temos o Banco Alimentar. Já repararam que até os pobres também têm o seu banco, como se de banqueiros se tratassem. Por acaso até têm uma certa parecença, pois volta e meia, tanto uns como outros aparecem tesos que nem uns virotes. Por isso podemos dizer que somos um povo engravatado sem solas nos sapatos.

 


 

Vou recuar no tempo até aos finais dos anos 30 do século passado, com a Guerra Civil Espanhola (1936/1939), em que a conhecida amizade de Franco e Salazar motivou deste último um claro apoio ao país vizinho, apoio esse que se prolongou para além do conflito, e já em plena Guerra Mundial.

Em direcção a Espanha, passavam comboios cujos vagões ostentavam grandes tarjas de pano dizendo: 

SOBRAS de PORTUGAL

Entretanto, o nosso povo sofria grande miséria!

Com o “racionamento”, todos os bens de consumo passaram a ser regulamentados por um sistema que atribuía a cada pessoa uma caderneta com senhas destacáveis onde eram indicados os produtos passíveis de obtenção. Eram quantidades ridículas e isso motivou o aparecimento de um mercado paralelo, clandestino, a “candonga”, com preços altamente inflacionados. Quem tinha dinheiro, comia. Quem não tinha, minguava à fome.

A “candonga” encheu muitos bolsos de traficantes sem escrúpulos.

Tudo servia para traficar, desde o azeite ao arroz. O milho, nesse tempo de importância primordial, conseguia-se clandestinamente a peso de ouro e com grande risco de quem o vendia.

 


 

Muitos para fazerem face à carestia de vida, recorriam ás casas de penhores, colocando coisas de valor no “prego”, tentando, entretanto, arranjar dinheiro para mais tarde a ir resgatar.

 

 


Pelo que li, a procura destas casas de penhores está novamente a aumentar. Quando uma família está mesmo de rastos, ao nível do chão, é quando coloca no prego as alianças do casamento, porque esses anéis por questão de ética familiar, são as últimas joias a penhorar.   

 


 

Nesses tempos aos sábados era notório a quantidade de pobres que percorriam as ruas da cidade de Penafiel, a pedir esmola. 

 

 


Na freguesia de Croca, concelho de Penafiel, em 2 de Janeiro de 1940, o seu regedor elabora a lista de pobres existente na freguesia, os quais passo a citar: Destes, apenas Ana de Jesus, doméstica vivia da mendicidade.

Lavradores – Adão Pinto; Vitorino da Silva; Adelino Teixeira; Agostinho Rebelo Ribeiro; António Moreira; António Moreira; António Nunes; António Ribeiro; António da Rocha; António Rebelo Ribeiro; António da Silva; António de Sousa; Francisco Ribeiro; Francisco Mendes Coelho; Joaquim Pinto; Joaquim de Souza; Joaquim Vieira Ferreira; Joaquim Brochado Cardoso; António Brochado; José Luiz e José Ribeiro da Cunha;

 

Doméstica – Adelaide de Jesus; Ana Emília dos Reis; Ana de Jesus; Ana de Oliveira; Ana de Sousa Magalhães; Emília de Jesus; Emília Rosa Ferreira; Francisca de Jesus; Ana Pereira; Gracinda de Jesus; Maria de Jesus e Felicidade Rosa;

Jornaleiro – Albano Nunes; António Ferreira; António Ferreira Alves; António Gomes; António José de Brito; António Luiz; António Maria Alves; António Pereira; António Pinto Santana; António Rebelo de Campos; António Teixeira; Aurélio Coelho; Constantino Alves Pinto; Constantino da Silva; Daniel do Couto; Eduardo Moreira; Firmino Pinto; João Pinto; João Teixeira; João Monteiro; Joaquim António Mendes; Joaquim Ferreira; Joaquim Ferreira Alves; Joaquim Ferreira Camilo; Joaquim de Matos; Joaquim Rebelo de Campos; Joaquim Ribeiro; Joaquim de Souza; Joaquim Teixeira; Joaquim de Campos; José Pereira; José Rebelo da Silva e José Soares Mendes.

 

Alfaiate – Joaquim Moreira;

Carpinteiro – António Joaquim Mendes e António Nunes de Souza.

Criveiro – Cristóvão Cardozo.

Sapateiro – Cândido de Souza Aguiar e Joaquim Vieira.

Galinheiro – Jaime Ribeiro; Joaquim Coelho de Almeida; Joaquim da Cunha e José Ferreira.

Ferreiro – Joaquim Pinto Santana;

Cesteiro – Agostinho de Brito; Joaquim Barbosa;

Trolha – Adão Ferreira; António Teixeira e José Teixeira.  

Pedreiro – António Barbosa Rebelo Moreira; António Mendes; António da Silva; Serviçal – Maria Isabel de Jesus

 


 

Com a guerra na Ucrânia, lá fomos nós carregados de alimentos, roupas e até conseguimos alojamento para esses refugiados no nosso país. Até aqui tudo bem. Mas é preciso também olhar pelo espelho retrovisor da vida, e vermos o que se passa à nossa rectaguarda, para não deixar para trás os nossos que caíram na pobreza, com abrigo ou sem abrigo.

 


 

Reuniu com toda a pompa e circunstância o Conselho de Estado, com todos os seus membros de barriga cheia a arrotarem “postas de pescada” sobre a fome. Os indigentes continuaram a dormir nas ruas tapados com cartão, e nem sequer deram por tal reunião que falava do seu drama e no final nem sequer foram capazes de transformar um quartel em dormitório para esta gente que padece ao frio do Inverno que se aproxima e à fome.

 


 

É este postal ilustrado da fome, que é preciso erradicar deste país, que continua a ser bom para turistas e “acólitos” dos partidos que estão no poder, e que ontem como hoje, continua a empurrar gerações e gerações dos seus filhos para a emigração para fugirem à mesma.

- Até quando vamos brincar à caridadezinha?

Já vai sendo tempo de deixarmos de brincar com estas coisas, pois caso contrário, não há alarme que segure as latas de atum ou o polvo nas prateleiras dos supermercados ou na mercearia de rua mais próxima, pois como diz o nosso povo, a fome é negra.

 


 

Como estamos no mês do Natal, não podia deixar de desejar a todos que por aqui passam, um Santo e Feliz Natal, com mais ou menos luzinhas de esperança a piscarem nas nossas consciências, para que estas coisas melhorem.

Pois como escreveu António Gedeão, “o sonho comanda a vida”.

- Boas Festas!

 

Fernando Oliveira – Furriel de Junho