01 junho 2024

PENAFIEL EM PÉ DE GUERRA

 PENAFIEL EM PÉ DE GUERRA

3 de Fevereiro de 1927




No período de tempo que decorreu entre o movimento militar de 28 de Maio de 1926 e a estabilização do Estado Novo, só verificada a partir de 1933, registaram-se em Portugal diversas revoltas contra a ditadura militar que tinha sido instaurada no país.


A 3 de Fevereiro de 1927, desencadeou-se no Porto a primeira revolta contra a ditadura militar. O Comité Revolucionário, era chefiada pelo general Adalberto Gastão de Sousa Dias, pelo Coronel Fernando Freiria, pelo tenente-coronel Pinto da Fonseca, o comandante Jaime de Castro Morais, pelo capitão-médico miliciano Jaime Cortesão, o capitão João Sarmento Pimentel e o tenente João Pereira de Carvalho.


Jaime Cortesão e Jaime Morais fardados, falam aos jornalistas


A revolta iniciou-se às 4,30h no Regimento de Caçadores 9, comandado pelo Capitão Pizarro, tendo estabelecido o seu quartel-general na Praça da Batalha.



Em Penafiel forças do Regimento de Infantaria 6, comandadas pelo tenente Ernesto de Almeida, assim como a guarnição local da GNR conduzidas pelo Capitão Alcídio de Almeida, juntam-se aos revoltosos na cidade do Porto.


Na Estação de Novelas, na altura do embarque ouve uma troca de tiros entre os militares (revoltosos e os apoiantes do governo) do RI 6.


A estas duas forças militarizadas (GNR e RI6) de Penafiel, que chegaram à cidade do Porto num comboio especial que os solidários ferroviários do Porto puseram à disposição, reforçando os revoltosos, vão-se juntar outras mais, vindas de Amarante, Guimarães, Santo Tirso, Valença, Lamego, Chaves, Bragança, Vila Real, Régua e Guarda.


O militar em 1.º plano de pé, é Emídio Guerreiro


Com estes reforços, vai ser ocupada a sede do Governador Civil do Porto, o Quartel da Região Militar do Norte, o Palácio dos Correios e Telégrafos e o quartel de Infantaria 18, forçando simultaneamente a retirada o Regimento de Cavalaria 9 fiel ao governo. Tendo sido detidos o Governador Civil do Porto, capitão José Luciano da Silva Cravo, o Ministro do Comércio, Brigadeiro Júlio César de Carvalho Teixeira, o Ministro da Instrução José Alfredo Mendes de Magalhães, que ainda se encontravam na cidade do Porto para onde se tinha deslocado a fim de presidirem ás comemorações do 31 de Janeiro, o presidente da comissão local de censura, os 1º e 2º comandantes da Região Militar, para além de outros oficiais.


Os militares da GNR de Penafiel, cercaram o posto rádio telégrafo do Regimento Nº2 de Sapadores Mineiros em Arca de Água, embora nunca o conseguissem tomar.


Trincheira no cimo da Rua 31 de Janeiro 


Os militares do RI 6 afectos ao governo, que permaneceram no quartel de Penafiel, vão tomar as seguintes acções:


Na madrugada do dia 5 de Fevereiro dinamitam a linha férrea entre Meinedo e Cete, a fim de obstarem a que chegassem mais reforços aos revoltosos vindo do Norte.


Ocuparam a ponte de Entre os Rios, impedindo o avanço da coluna do Major Varão que tendo vindo até Vila Meã e sabendo que toda esta região e respectiva linha férrea estavam em nosso poder, retrocedeu para Amarante.


Tomaram a estação telegrafo-postal da cidade de Penafiel, assegurando as ligações com as tropas fiéis.



Trincheira junto ao Teatro S. João na Praça da Batalha


Entretanto na cidade do Porto foi montada uma linha defensiva com trincheiras em todos os seus acessos, na qual detinham uma particular importância as que dominavam a entrada na cidade através do tabuleiro superior da Ponte de D. Luís I e a que se situava no cimo da Rua de 31 de Janeiro/entrada da Rua de Santa Catarina.


O ministro da Guerra, o tenente-coronel Passos e Sousa, mobiliza todas as forças disponíveis para avançar contra o Porto. Uma vez aí chegadas, concentraram-se na Serra do Pilar, onde se lhes juntaram tropas vindas de Coimbra e de Lamego, tendo o comando-geral sido assumido pelo coronel João Carlos Craveiro Lopes, pai do futuro Presidente da República.


Artilharia em Vila Nova de Gaia


A partir dessa excelente posição estratégica, iniciaram então um bombardeamento ininterrupto do Porto, visando as posições dos revoltosos no centro da cidade.



Não obstante os enérgicos protestos do general Sousa Dias, que considerava ser do mais elementar princípio do Direito Internacional que não se fizesse fogo sobre uma cidade aberta sem que fosse previamente prevenida a sua população, e do general-comandante da Região Militar, José Ernesto Sampaio, que promulgou uma nota oficial pedindo, em nome da humanidade, que não bombardeassem as casas dos habitantes, assim como da indignação generalizada que tal decisão governamental suscitava junto da população, os efeitos do bombardeamento começavam a fazer-se sentir.


Os prejuízos por este provocados eram incalculáveis, havendo prédios na zona da Sé que se desmoronaram por completo. Os mortos e feridos - civis na sua maior parte - eram em número avultado. Pairava um ambiente de enorme ansiedade, o que levou muitos habitantes a abandonarem a cidade e aqueles que permaneceram procuravam, sempre que podiam, refúgio nas caves dos prédios.


O comércio e a indústria estavam paralisados. Os géneros alimentares escasseavam e o mercado negro começava a instalar-se.


A rendição, na tarde de 5 de Fevereiro, do Regimento de Infantaria 18, constituiu a antecâmara da capitulação dos revoltosos.


Os líderes revoltosos comandante Jaime Morais e Major Severino, são levados vendados à presença do Ministro da Guerra, Tenente Coronel Passos e Sousa


Finalmente, pelas 4h00 do dia 8, após um encontro entre o major Alves Viana, comandante da GNR, e o general Sousa Dias, este subscreveu uma mensagem que foi enviada ao ministro da Guerra em que se propunha a rendição das forças sublevadas, mediante determinadas condições, entre as quais a "isenção de responsabilidades aos sargentos, cabos e soldados".


Os revoltosos justificavam a sua decisão pelo "respeito à cidade do Porto, à qual agradeciam o amparo moral e material" durante as hostilidades.


Ministro da Guerra Tenente-Coronel Passos e Sousa de fardamento escuro ao centro.


Algumas horas mais tarde, já o dia despontava, Passos e Sousa entrou na cidade através da Ponte de D. Luís I, tendo, contudo, avisado previamente que qualquer civil encontrado com armas seria fuzilado de imediato.


O balanço da revolta era pesado, não só para os revoltosos, mas em especial para os portuenses: 80 mortos e 360 feridos.



Cadeia de Aipelo - Timor


A “Revolta de 3 de Fevereiro de 1927” redundou numa derrota desastrosa do bloco revolucionário: os implicados foram presos e deportados aos milhares para as Ilhas Atlânticas e para as Colónias (Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique e Timor), presos ou em estado de residência fixa, e demitidos dos seus cargos públicos ou afastados da sua vida comum.



No Diário do Governo Nº 47/1927, Série 1, de 8 de Março de 1927, o Ministério da Guerra publica o Decreto 13244, que fixa as normas em que deve proceder-se à execução do disposto no artigo 1.º do decreto n.º 13138, relativamente à dissolução das unidades do exército que, total ou parcialmente, tomaram parte nos movimentos revolucionários de Fevereiro de 1927, sendo o Regimento Infantaria 6 de Penafiel dissolvido e organizado de imediato o Depósito do RI 6 que englobava;

  • O Comando do Depósito exercido por um oficial superior.

  • Uma Secretaria de Depósito

  • Um Concelho Administrativa

  • Uma Formação à qual ficavam a pertencer os oficiais e as praças.



E foi assim que nestes dias longínquos do ano de 1927, Penafiel viveu em pé de guerra, e pelo que se sabe hoje, os vencidos estavam do lado certo da história.



Fernando Oliveira – Furriel de Junho